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Grieving Soul – Capítulo 5 – Volume 5

Nageki no Bourei wa Intai shitai Let This Grieving Soul Retire Volume 05

Capítulo x: [xxx]


A cidade de Suls estava cercada por uma legião de cavaleiros vestindo armaduras negras e montados em cavalos. Tremulando violentamente ao vento estava uma bandeira com três lâminas cruzadas—o selo do Lorde Gladis. Um homem com uma armadura resplandecente desmontou do cavalo na dianteira e ergueu os olhos para o muro que cercava a cidade.

— O que estou olhando? — murmurou.

— Você demorou para chegar — disse uma voz.

— Quem é você?! — gritou o cavaleiro.

Uma sombra surgiu sob o portão da cidade, e todos os cavaleiros sacaram suas lâminas.

— É assim que vocês cumprimentam alguém? Extremamente rude, considerando que fizemos o trabalho de vocês. Bem, foi apenas algo que fizemos de passagem durante as férias.

Sitri deu um tapinha no ombro de Matadinho, que arfava em antecipação. Com um sorriso, ela retirou a ordem de missão e a jogou no chão. O capitão dos cavaleiros ficou chocado ao ver o selo de seu senhor no documento.

— Isso dificilmente é algo que exige nossa cooperação com outros. Como vocês demoraram, nós fomos em frente e esmagamos Barrel.

— Cooperação? Você está dizendo que pertence aos Grieving Souls?!

— De fato. Meu nome é Sitri Smart, sou responsável por negociar em nome do nosso grupo. Ouvi muito sobre suas heroicas façanhas.

Ela tinha uma postura calma que não sugeria estar acostumada com o trabalho violento. Seu cabelo curto e rosado esvoaçava levemente ao vento. O capitão dos cavaleiros ficou surpreso com seu sorriso plácido e encantador.

Seus subordinados também começaram a hesitar. Tinham ouvido falar que uma missão nomeada havia sido atribuída aos caçadores de tesouros. Não estavam entusiasmados com a ideia de cooperar com pessoas que preferiam saquear cofres de tesouro a manter a segurança pública, mas não deixaram seus sentimentos pessoais interferirem no dever.

Estavam completamente confusos. Pelo que sabiam, os caçadores ainda nem haviam chegado ao Condado de Gladis. Apenas no dia anterior receberam a informação de que um grupo com a descrição do Esquadrão de Ladinos Barrel estava deixando o domínio. Não querendo esperar pelos caçadores e buscando reparar seu orgulho, os cavaleiros partiram a cavalo.

Quando finalmente chegaram ao destino e viram os caçadores já ali, parecia que haviam entrado em outra realidade. Mas a ordem de missão era legítima. O capitão a pegou depois de ter sido tão rudemente jogada no chão.

Sem saber o que perguntar primeiro, ele finalmente disse:

— Por que estão aqui? Estávamos esperando por vocês.

— Estávamos à espreita. Talvez seja melhor dizer que os estávamos atraindo, mas não se preocupem conosco. Nosso objetivo principal era caçar um dragão, mas lançamos uma rede ampla e pegamos o Esquadrão de Ladinos Barrel também. Cada um deles.

O respeitável capitão não podia acreditar no que estava ouvindo. O Esquadrão de Ladinos Barrel era prudente, mas ousado. Repetidamente haviam humilhado os cavaleiros de elite do Lorde Gladis ao enfrentá-los. Sua extrema cautela era um espinho particularmente incômodo.

Ao atacar uma cidade, Barrel sempre enviava batedores para determinar o nível de resistência. Se fosse mais do que podiam lidar, nem pensavam em atacar. Como eram um grupo itinerante, não tinham uma base fixa, e nenhum de seus esconderijos temporários jamais havia sido descoberto.

Eles simplesmente desapareciam quando grandes forças eram reunidas para exterminá-los. Tinham algum meio de erguer grandes muralhas. Espalharam o caos no Condado de Gladis, um lugar que a maioria dos criminosos temia pisar, manchando o nome de uma das lâminas que protegiam o império. Barrel era realmente astuto.

No entanto, não havia sinais de que a cidade havia sido saqueada, embora fosse evidente que algo acontecera. Os cavaleiros tocavam o muro de pedra e trocavam olhares. Ele se assemelhava às muralhas que haviam aparecido em diversas ocasiões enquanto perseguiam os ladinos.

— O que é isso? Não me lembro de esta cidade ter uma muralha tão grande ao seu redor — disse o capitão.

Suls era um famoso destino turístico. Supostamente, não tinha quase nenhuma defesa.

Sitri pressionou um dedo contra os lábios.

— Esta cidade estava desprotegida, então pedimos que Barrel construísse isso para nós. Admito que precisa de alguns reforços, mas deve servir por enquanto. Você conhece a previsão do Mil Truques?

O capitão, é claro, conhecia. Mas ainda não podia acreditar, mesmo vendo a evidência diante dos olhos. Ele poderia aceitar a história sobre a emboscada, mas algum humano realmente poderia manipular eventos a esse nível? E como o Mil Truques entendia os movimentos de Barrel quando tão pouco se sabia sobre eles? E o que era isso sobre um dragão?

Os outros cavaleiros pareciam igualmente incrédulos.

— Vocês não precisam nos agradecer. Algo como o Esquadrão de Ladinos Barrel é uma mera trivialidade para o Mil Truques. No fim, nosso foco era aproveitar as férias.

O capitão sabia que estava sendo feito de bobo, mas lutava para protestar quando era tão descarado. Isso o frustrava, mas sua prioridade era compreender a situação. Ele ofereceu um agradecimento preliminar a Sitri e começou a inspecionar a cidade.

***

Deixei os vários detalhes nas mãos de Sitri, como sempre fazia, e voltei para a estalagem com Luke e todos os outros.

Desta vez, o problema havia surgido em uma escala bem grande. Havia, é claro, os Trogloditas que perseguiam a cidade, mas o dragão também havia destruído vários prédios. Também criamos uma boa dose de problemas para Arnold e seus companheiros. Eu sabia que, como líder dos Grieving Souls, era minha responsabilidade pedir desculpas, mas isso só parecia piorar as coisas. Não me restava outra escolha a não ser deixar tudo com Sitri.

Fazia tempo demais desde a última vez que vi os rostos de Luke, Ansem e Lucia. Éramos amigos desde a infância e nos víamos quase todos os dias, então passar mais de um mês sem encontrá-los era realmente incomum.

Quando chegamos ao meu quarto, os olhos vermelhos característicos de Luke começaram a brilhar.

— Então, Krai, cadê a minha parte dos dragões e dos Homens das Cavernas?

— Em lugar nenhum.

— O quê? Você tá favorecendo alguém?! Aqueles caras do Barrel não foram o suficiente, a Lucia deu cabo da maioria deles!

Meus amigos não tinham mudado nada desde que partiram para o Palácio Noturno. Eu não vi nenhum dos ferimentos que Sitri mencionou, e o casaco de Luke estava impecável. Parecia que eles tinham atravessado o cofre do tesouro sem problemas.

Mas que absurdo. Ele viu os Trogloditas e o dragão como parte de uma recepção calorosa? E o que ele queria dizer com Barrel? Ele os derrotou no caminho para Suls? Que espírito livre.

— Esperamos por vocês — eu disse. — E além disso, isso era para ser uma folga.

— Então não foi um Desafio. Entendi. Bem, ainda assim teria sido um bom aquecimento. E eu realmente queria ver os Homens das Cavernas. Você não queria, Lucia?

— Não sou idiota, Líder. Vim porque ouvi que você estava em uma fonte termal, só para acabar metida nessa confusão.

Imagino que o feitiço de transformação em sapo tenha mesmo acabado com ela. Ofegante, Lucia desabou no chão assim que chegamos ao meu quarto. Ela virou apenas a cabeça na minha direção quando falou.

— Você limpou uma bagunça para mim? — perguntei.

— Hã?!

Não me entenda mal, eu sabia que Lucia sempre me tirava de enrascadas. Ela era uma irmã boa demais para um cara como eu. Mas desta vez, ela não fez nada por mim. Claro, lançou o feitiço de transformação em sapo no momento exato, mas não foi como se ela tivesse feito isso para me salvar ou ajudar alguém do nosso grupo. Eu me perguntei do que mais ela poderia estar falando.

— Se ao menos você estivesse lá quando os Trogloditas andavam pela cidade — eu disse.

— Aaaah! Maldição, maldição, maldiçã— — Ela então começou a tossir sem parar.

Eu lhe entreguei um copo d’água.

— Você está bem?

Ela tomou um grande gole, tossiu mais algumas vezes e respirou fundo.

— Obrigada. Eu me esforcei um pouco demais.

Sua voz estava rouca e seu rosto pálido, mas, no geral, parecia bem. Não tinha nenhum ferimento digno de nota.

Assim como eu, Lucia tinha cabelos e olhos negros, mas os dela possuíam um brilho que os meus não tinham. Seu corpo esguio a fazia parecer frágil, nada parecida com uma caçadora. Ela tinha uma tendência a desabar, mas não por doença ou constituição fraca. Mesmo tendo uma grande reserva de mana, sempre precisava descansar após lançar um feitiço poderoso.

Ela se sentou, tomou outro gole e me olhou friamente.

— Você limpou uma bagunça para mim?, ele diz. Dá para parar de ir aumentando o nível de dificuldade aos poucos?

— Eu gosto do nível de dificuldade. É um bom treino — disse Luke.

— Mmm — Ansem murmurou com um aceno profundo. Ele estava deitado de lado, incapaz de se levantar mesmo no meu quarto de teto alto. Com seus quatro metros de altura, ele não cabia na maioria dos cômodos.

Eu só pude suspirar. Lucia se opôs, Luke se contrapôs e Ansem assentiu. Esse cenário familiar era reconfortante. Tínhamos acabado de sair de um grande problema, mas finalmente senti que estava de férias de verdade.

— Já que vocês vieram até aqui, vamos encontrar uma fonte termal onde Ansem possa caber e descansar bastante.

Mesmo um quarto em uma pousada de luxo era claustrofóbico para Ansem, mas eu me sentiria mal em deixá-lo acampando do lado de fora. Ainda bem que estávamos em uma região cheia de fontes termais. Eu tinha certeza de que encontraríamos um lugar para ele.

No pior dos casos, posso fazer a Lucia cavar uma.

— Você ficou descansando o tempo todo, não ficou? — Lucia perguntou.

— Ah, acabei de lembrar. A Tino foi transformada em sapo e tudo mais, mas presumo que você tenha um feitiço para reverter isso?

— Como se eu tivesse! Só fazer o feitiço de transformação já foi um baita desafio. Me diga, havia algum feitiço de reversão naquele livro que você me deu?

Em pânico, a Tino-sapo começou a coaxar enquanto pulava dentro do frasco. Olhei para ela com pena, mas me recuperei rápido. Lucia tinha um ponto, mas essa não era hora para brincadeiras. Liz segurava o pote e ria, mas, pelo visto, simpatia não fazia parte do seu repertório.

Tino e Lucia não eram amigas? Me perguntei, congelado no lugar com um sorriso forçado.

— Tá tudo bem — Lucia disse com um pequeno suspiro. — Mesmo que não haja um feitiço para fazê-la voltar ao normal, ela reverte se for morta.

Isso não parece nada bem.

Tino soltou um grito agonizante.

Eu não sabia o que fazer. Eu teria que contar aos pais dela que minha irmã mais nova transformou a filha deles em um sapo?

De jeito nenhum que eu poderia fazer isso.

— N-Não se preocupe, Tino. Eu assumo a responsabilidade e cuido de você — eu disse.

— Dá pra parar de falar besteira? Olha só!

Lucia ergueu um braço esguio e estalou os dedos. O frasco nas mãos de Liz subitamente pegou fogo.

Era exatamente o tipo de coisa que eu sempre imaginei que Magos fossem capazes de fazer. Criar fogo só com um estalar de dedos estava no meu primeiro volume de feitiços legais. Lucia, ainda em treinamento na época, passou um mês inteiro trabalhando nesse feitiço. Eu tinha memórias amargas de levar uma surra por rir ao descobrir que levou tanto tempo.

Fiquei sem palavras com a súbita combustão. Mas no momento em que os gritos de Tino desapareceram em meio às chamas, a Tino-humana apareceu. Liz a pegou nos braços. Tino estava exatamente como antes de ser transformada em sapo. Um yukata azul com um obi bem amarrado. Olhos marejados de lágrimas.

Então era isso que a Lucia queria dizer. Eu não tinha prestado muita atenção até agora, mas as roupas dela desapareceram junto com ela quando virou um sapo. Como isso funciona, afinal?

Tino olhou para mim, depois para Lucia, Luke e finalmente para Liz. Quando finalmente processou o que havia acontecido, abraçou Liz com força.

— L-Lizzy! Achei que ia ser um sapo pelo resto da minha vida! — disse ela, enquanto lágrimas escorriam pelo seu rosto.

— Pronto, pronto, T — Liz disse, segurando Tino. — Vamos fazer um treinamento especial para você nunca mais virar um sapo de novo.

— M-Mestre, me salva! Lucy!

— T não mudou nada — observou Luke. — Certo, Krai, vamos para uma fonte termal! Você não sabe nadar, né? Olha, eu trouxe uma boia!

Por que não?

Me rendi ao alvoroço e soltei um suspiro de alívio, sabendo que finalmente a normalidade havia voltado. Tivemos altos e baixos, mas fiquei feliz por termos tirado essas férias. E como estávamos todos juntos, considerei isso uma vitória.

Percebendo meu sorriso tranquilo, Lucia pareceu se lembrar de algo e me encarou com os olhos semicerrados.

— Acabei de lembrar de uma coisa, Líder. Talvez você já saiba disso, mas a batalha entre Maldição Oculta e Torre Akáshica está causando estragos na capital imperial. Voltamos rápido por causa das nossas férias, mas, bom, todo mundo por lá está te chamando. É verdade que foi você que instigou essa briga?

— Claro que não. Agora, vamos, Lucia, você também deve estar cansada. Vamos relaxar numa fonte termal!

***

Eles estavam fora de si. A Lâmina Proteana desembainhou a espada, ignorando os reféns e a situação. Enquanto Geffroy jazia na terra, o Mil Truques zombava dele com piadinhas simples. Os líderes do Barril estavam em grande desvantagem, tanto em força quanto em pragmatismo.

Geffroy estava deitado próximo à saída da cidade, preso em correntes. O cavaleiro de armadura, o Imutável, já havia regenerado seu braço direito. Suas armas foram confiscadas, mas ele ainda tinha liberdade para se mover.

Patrulhando por perto estavam os cavaleiros do Lorde Gladis, aqueles mesmos que ele já havia superado tantas vezes antes. Vários deles mantinham um olhar atento sobre Geffroy e Kardon, observando cada mínimo movimento.

O Esquadrão de Bandoleiros Barril tinha recompensas por suas cabeças em todo o reino. Só estavam vivos porque não resistiram quando foram capturados pelo Mil Truques e seu grupo. Normalmente, seriam executados no momento em que fossem presos. E, embora ainda respirassem, era provável que estivessem destinados à forca.

Precisavam se livrar das amarras de qualquer maneira. Mas esse não era o momento de tentar nada.

A magia foi o fator decisivo na derrota deles. Nada era mais problemático do que um mago capaz de anular uma vantagem numérica. Haviam tomado medidas anti-magia, mas não foram o suficiente.

Geffroy tinha confiança de que poderia enfrentar qualquer número de cavaleiros do Lorde Gladis. Mas havia aquele homem que o tratou como um mero civil. Enquanto ele estivesse por perto, escapar parecia impossível.

Aquele homem era aterrorizante. Mesmo com a vitória garantida, continuava se fingindo de fraco. Sua prudência ultrapassava até mesmo a do Barril. Frio e calculista, usava pessoas como isca e manipulava monstros, táticas que nenhum caçador respeitável consideraria. Algo estava errado se um homem como ele podia andar livremente.

Geffroy e Kardon haviam escolhido o caminho errado. Deveriam ter seguido uma abordagem semelhante à do Mil Truques e se passado por aliados da justiça. Kardon estava deitado imóvel no chão, mas provavelmente já tramava um plano para o futuro.

No entanto, era tarde demais para mudar de rota. Geffroy, Kardon e o Esquadrão de Bandoleiros Barril eram muito conhecidos. Teriam que superar os Grieving Souls sendo os bandidos que sempre foram.

Grieving Souls era um grupo de sete, mas Geffroy sabia que o Barril sozinho não seria suficiente para vencê-los. Seria necessária cooperação. Iriam se aliar à Torre Akáshica e a diversos outros sindicatos mágicos e organizações criminosas. Até agora, suas relações eram apenas comerciais, mas isso teria que mudar.

À distância, ele conseguia ouvir os cavaleiros, todos vestidos com armaduras idênticas, conversando entre si.

— O que vamos fazer com esses sapos?

— Não esperávamos capturar todos os bandidos vivos. Teremos que transportá-los ainda como sapos.

— Tem tantos… O capitão está preocupado que possa haver civis e caçadores errantes misturados no meio…

— Precisamos garantir que ninguém escape…

— Nunca vi ou sequer ouvi falar de uma magia assim. Parece coisa de conto de fadas.

Parece que o Barril não era o único perplexo com o que aconteceu.

Os Grieving Souls estavam escondendo algo. E isso sem falar no ataque dos demônios, que provavelmente complicava ainda mais as coisas. Era seguro assumir que havia desconfiança em relação ao Mil Truques. E, se fosse o caso, havia uma brecha que poderia ser explorada.

Então, um homem em uma armadura ornamentada se aproximou deles. Era o capitão dos cavaleiros do Lorde Gladis, um homem que talvez fosse páreo para Geffroy em um combate direto. Geffroy não iria resistir — isso só daria ao cavaleiro um motivo para matá-lo. O capitão parecia entender isso e estalou a língua.

— Você, Geffroy Barril — disse ele. — Quantos eram no seu grupo? Nossas investigações indicavam pouco mais de cem, mas talvez fossem mais perto de trezentos… mais um?

Os olhos de Kardon se arregalaram, apenas ligeiramente. Disfarçar sua força era uma parte fundamental da batalha. Durante seus combates contra os cavaleiros do Lorde Gladis, o Barril manteve a maioria de seus membros escondidos. Certamente nunca os revelou todos de uma vez.

— Não tente nos enganar. Podemos investigar por conta própria e saber se está mentindo.

O cavaleiro lançou um olhar afiado para Geffroy. Parecia que ele não iria se tranquilizar, mesmo com o Barril estando tão enfraquecido. Mas deixando isso de lado, a contagem dos cavaleiros parecia um pouco alta.

— Contar cada sapo um por um vai levar tempo. Os Grieving Souls realmente nos colocaram em uma posição complicada.

Esses cavaleiros eram lentos e cautelosos, mas foi exatamente por isso que foram superados pelo Barril tantas vezes. Parecia improvável que sua contagem estivesse errada, mas, a menos que Geffroy estivesse enganado, eles erraram por três.

— Esse número está correto — Kardon respondeu em voz baixa, olhando para o chão.

Então Geffroy se lembrou. Haviam capturado três falsos Grieving Souls e os mantiveram em um espaço separado dos outros prisioneiros. Eles deviam ter sido transformados em sapos.

Foram eles que iniciaram tudo isso. Não foram os cúmplices mais competentes. Geffroy não sabia qual era a relação deles com o Mil Truques, mas…

— Sim. Isso mesmo — Geffroy concordou.

— Entendo.

Ele ao menos iria levar aqueles três consigo. O mais leve traço de um sorriso surgiu nos lábios de Kardon. Parecia que ele estava pensando a mesma coisa. O Barril tinha sofrido um grande golpe, mas seus líderes ainda eram capazes de entender os pensamentos um do outro.

Geffroy foi empurrado para dentro de uma carruagem trazida pelos cavaleiros, e Kardon foi jogado em outra. Os sapos foram empacotados em sacos.

Eles perderam membros, armas, fundos e muito mais, mas o Esquadrão de Ladinos Barril ainda persistia. Perderam desta vez, mas Geffroy e Kardon ainda não estavam mortos. Reacenderam sua determinação: um dia, fariam aqueles caçadores se arrependerem de não tê-los eliminado.

Com os bandidos carregados, a carruagem partiu lentamente de Suls.

***

— Hmm? O que foi isso? Já exausta do cofre do tesouro, retorno à capital imperial apenas para descobrir que você foi para uma fonte termal. Aí, eu me dirijo para a fonte termal e me vejo limpando uma bagunça. E depois de tudo isso, é isso que você tem a dizer? Eu escutei errado? Realmente espero que sim.

As sobrancelhas de Lucia se contraíram enquanto ela me olhava com um olhar afiado que a maioria das pessoas não dirigiria a seus irmãos. Sua aparência havia melhorado significativamente, sugerindo que uma noite de descanso fez muito bem a ela. Isso é o que importa.

Lucia se aproximou do meu rosto, ao que sorri de forma sem graça e dei um passo para trás. Um suor frio escorreu pelas minhas costas. Não tive nenhuma intenção ruim. Apenas disse o que estava na minha cabeça, mas isso despertou a ira da minha irmã.

— E-Err… Você foi incrível lá atrás? Uhum. Sempre posso contar com a minha irmãzinha.

Tentei elogiá-la, mas sua expressão não mudou. Embora fôssemos irmãos adotivos, passamos muito tempo juntos e ela sabia muito bem que tipo de pessoa eu era.

Luke e Liz nunca me ajudavam nesses momentos, apenas assistiam com diversão. Até mesmo Tino estava observando enquanto se escondia atrás das costas de Liz. Eu não tinha aliados.

Lucy entrelaçou seus dedos esguios e sorriu.

— Por favor, diga isso de novo, Líder. É possível que meus ouvidos tenham me enganado.

Permaneci em silêncio.

— Oh, querido irmão?

— O-Os sapos em que você os transformou — eu disse. — Eram da variedade errada.

Lucia rangeu os dentes.

— Você os transformou em pererecas. Normalmente, são rãs-touro…

— Eu nunca ouvi isso! Olha esse livro, foi você que fez! Olha! Olha! Olha! — ela gritou, enfiando o grimório na minha cara. Era o que eu havia escrito há muito tempo. Em uma página velha e desgastada, estava a linha “Feitiço que transforma o alvo em um sapo”. Não havia mais detalhes, as margens estavam preenchidas com as anotações de Lucia.

— Onde está especificado rãs-touro?! Me diga! Onde? Onde? Onde?

— C-Certo, mas o feitiço se chama Milagre da Bruxa, e isso implica rãs-touro. Não há nada de bruxesco em pererecas.

O grimório que escrevi apenas descrevia os efeitos dos feitiços, porque era apenas uma lista infantil de fantasias. Eu nem sequer considerei coisas como conveniência, apenas enchi as páginas com meus sonhos. Mas é exatamente por isso que eu me importava com os detalhes.

— N-Não se preocupe. Se você pode transformar pessoas em pererecas, deve conseguir transformá-las em rãs-touro.

— Não, eu não posso! Não é tão simples! Me avise dessas coisas antes de eu fazer o feitiço! Esse já foi difícil o suficiente! Você não vai me mandar refazê-lo, vai?

Os lábios de minha irmã tremeram. Ela sempre fazia isso quando ficava irritada.

Do ponto de vista de um amador, não parecia tão difícil, mas aparentemente havia uma diferença enorme entre feitiços de pererecas e de rãs-touro. Claro que eu não ia mandar ela refazê-lo.

Levantei as mãos de forma apaziguadora.

— Eu nunca faria isso. O feitiço de perereca já é incrível o suficiente. Talvez não seja muito bruxesco, mas eu não vou pedir para refazer! A propósito, estava pensando se você poderia usar sua magia para abrir uma fonte termal. Uma que o Ansem possa caber dentro.

— Não existe tal feitiço.

— Pode criar um? Se alguém pode fazer isso, esse alguém é você.

Lucia me lançou um olhar feroz, e lágrimas começaram a se formar em seus olhos. Com um movimento ágil, ela estalou os dedos. Algo grande caiu bem na minha frente. Tino arregalou os olhos ao olhar para aquilo.

Era um boneco de pelúcia. Um bem grande, claramente modelado à minha imagem.

Sem dizer uma palavra, Lucia agarrou o pescoço do boneco com a mão esquerda e, com a direita, desferiu um soco direto no seu plexo solar. O impacto fez o cômodo inteiro vibrar. Parecia que ela estava guardando muito ressentimento. Acontece quando se está numa fase rebelde.

Ilustração Let This Grieving Soul Retire! Volume 5 17 do capítulo Grieving Soul – Capítulo 5 – Volume 5

— Oooh, Lucy está perdendo a paciência. E olha que ela sempre é tão calma quando o Bebê Krai não está por perto — comentou Liz.

— Tá tudo certo, Lucia. Se precisamos de uma fonte termal, eu mesmo posso cavar — ofereceu Luke. — Alguém me arranja uma pá.

— Eu queria um boneco de pelúcia assim… — murmurou Tino.

Eu apenas olhei para o outro lado.

Então, Sitri voltou de suas negociações. Em suas mãos, havia um esfregão com um cabo de um metro de comprimento. Ela pareceu um pouco surpresa ao ver Lucia socando o boneco de pelúcia, mas logo se recuperou.

— Infelizmente, não há fontes termais grandes o suficiente para acomodar meu irmão. No entanto, consegui permissão para cavar uma. Isso seria aceitável?

Perfeito.

— Vendi tantos núcleos de golem! — disse Sitri enquanto a seguíamos para fora do quarto.

Nos reunimos com Ansem, que esperava na sala de jantar da estalagem devido ao seu tamanho. Sitri então nos guiou até o local designado para sua fonte termal. Ver todos, exceto eu e Ansem, usando yukatas dava um toque especial à experiência.

Tino lançou um olhar furtivo para mim. Ela era a única presente que não fazia parte dos Grieving Souls, mas essa não era a primeira vez que a incluíamos. Ela estava entre amigos.

— P-Por falar nisso, Mestre, como você pretende cavar a fonte? — ela perguntou.

Era uma pergunta perfeitamente razoável.

— O que você quer dizer, T? Com uma pá, como mais? — respondeu Luke sem a menor hesitação.

— Hã? Mas, Luke, não há garantia de que você vai encontrar uma nascente, e pode ser necessário cavar vários metros…

— Vamos cavar o quanto for preciso. Isso também faz parte do treinamento! O caminho da espada abrange todos os aspectos da existência. Em outras palavras, cavar buracos também é um tipo de treinamento! Certo, Krai?

— É, aham.

Luke, você realmente fica mais forte independente do que faz? Eu não entendo.

Se nem confiscar sua espada era suficiente para impedi-lo, então ele continuaria crescendo, não importava o que eu fizesse. Ultimamente, ele não tinha muitos momentos de destaque, mas Luke Sykol não era do tipo que se deixava abalar por isso.

Tendo descontado sua raiva no boneco de pelúcia de Krai, Lucia pigarreou e disse:

— Ainda assim, fico aliviada que você escolheu uma fonte termal e não o oceano.

— Hm? Por quê?

O oceano. Não parecia uma má ideia. Dessa vez, eu estava no clima para uma fonte termal, mas gostava de aproveitar o mar. Eu não sabia nadar, mas só de curtir o sol e a brisa marinha já era relaxante o suficiente.

Na próxima viagem, vamos para o oceano.

Lucia franziu a testa e esfregou as têmporas.

— Você nunca sabe o que pode sair do oceano — disse ela. — Uma fonte termal é muito mais segura.

— Mas, Lucy, por aqui já tivemos dragões e Trogloditas — apontou Tino.

— Ah, queria ter chegado mais cedo. Krai, agora estou procurando um Espadachim de oito braços! Estou contando com você! — Luke me disse.

Nosso mundo era cheio de perigos. Acho que visitar cafés na capital imperial realmente era a opção mais segura. E agora Luke estava contando comigo para mais alguma coisa.

— Por que não luta contra quatro Espadachins ao mesmo tempo? — sugeri, sem pensar muito.

— Hm? Como assim?

— Quatro caras somam oito braços.

Eu queria dizer que qualquer coisa com oito braços seria um monstro, mas então me lembrei dos Trogloditas. Eles não carregavam espadas, mas poderiam, com aqueles cabelos deles e tudo mais.

Luke pensou por um momento e então bateu palmas.

— Você é um gênio! Vou fazer isso. Para ser sincero, eu estava preocupado com o que faria depois de derrotar um inimigo de oito braços, mas desse jeito, posso continuar indefinidamente!

— É, aham.

Sentada no ombro de Ansem, Liz nos observava com exasperação. Pessoalmente, eu estava curioso para ver até onde Luke poderia ir.

Seguindo Sitri, chegamos a um terreno vazio com cerca de cem metros quadrados. Era completamente deserto, exceto por algumas pedras e tufos de grama.

— Recebi este terreno como parte do pagamento pelos meus golems! — disse ela com seu típico sorriso e um bater de palmas. — Eu não tinha um esconderijo em Suls, então achei que essa era a oportunidade perfeita.

Lucia, perplexa, olhou para o lote.

— Um esconderijo? O que você pretende fazer com um pedaço de terra tão aberto?

Era um lugar na periferia da cidade, num local inconveniente. Não morávamos ali, passávamos a maior parte do tempo na capital imperial. Sem falar no custo absurdo de construir uma casa. Mas estávamos com quase todo o grupo reunido (exceto Eliza); para nós, o céu era o limite.

Estalei os dedos.

— Certo, Lucia! Faça uma fonte termal para nós!

— Com licença?!

— Não se esqueça da cachoeira! — acrescentou Luke.

Lucia era uma Maga excepcional. Sitri também podia fazer praticamente qualquer coisa, mas os feitiços de Lucia não precisavam de preparação prévia. Normalmente, ela dizia que nossos pedidos eram impossíveis, mas bastava darmos um tempo para que ela descobrisse uma solução. Essa era Lucia Rogier.

Olhei para ela, cheio de expectativa. Ela retribuiu com irritação.

— Ah, e depois disso, pode fazer uma estalagem para a gente ficar? Grande o suficiente para Ansem — acrescentei.

— E coloca corredeiras e um redemoinho! — disse Luke. — Pode ser só num cantinho—

— Eu quero uma sauna! Uma beeem quente! — interrompeu Liz. — Assim posso treinar minha resistência ao calor ao mesmo tempo!

— Não se preocupe, Lucy, eu preparei uma poção para você — garantiu Sitri.

— Hum, será que eu poderia ter um boneco de pelúcia do Mestre? — pediu Tino.

— Vocês acham que Magos podem fazer qualquer coisa? — suspirou Lucia.

Tínhamos certeza de que ela podia. Decidi que, da próxima vez que escrevesse um grimório, seria para coisas do dia a dia como essa. Ela provavelmente não ficaria muito animada com isso.

Então, Ansem falou pela primeira vez durante nosso encontro. Sua voz profunda ecoou através de sua Relíquia de armadura.

— Minhas desculpas. Não tenho objeções a acampar e posso viver sem entrar em uma fonte termal. Estou acostumado com isso.

Diferente de suas irmãs mais novas, Ansem Smart era uma pessoa de poucas palavras. Ele era o mais velho do nosso grupo e sempre esteve lá por nós. Se eu não tivesse sido forçado a ser o líder, ele provavelmente teria assumido o papel. Ele era nosso membro mais humano, popular na capital imperial, e sua igreja se reconstruiu para acomodá-lo.

Mas Ansem tinha a tendência de colocar as necessidades dos outros antes das suas. Suponho que, se somássemos seu altruísmo com o egoísmo da Liz e dividíssemos por dois, o resultado ficaria equilibrado. Foi para nos proteger que ele se tornou um gigante.

Mesmo que ele dissesse que estava tudo bem, eu não podia aceitar isso.

Luke deu de ombros, resignado, e bateu o punho contra a armadura de Ansem.

— Ei, Ansem, dá uma olhada nesse terreno. Você tem só quatro metros, tem espaço de sobra para você! Pensa bem, se tem cem metros quadrados, então caberiam, hã, vinte e cinco de você.

Eu não fazia ideia do que Luke estava falando, mas concordei completamente.

— Ele tem razão — eu disse, apoiando Luke. — Não se preocupe. Se não tiver espaço suficiente, podemos pedir para a Lucia distorcer o espaço. Fácil, fácil.

— Espera aí! Vocês podem pensar antes de sair falando essas coisas? — Lucia protestou. Então ela refletiu. — Bom, eu não consigo fazer uma estalagem aparecer do nada, mas cavar um buraco não deve ser difícil. Não precisa se preocupar, Ansem. Vou colocar nosso líder preguiçoso para trabalhar.

— Eu ajudarei no que puder! — ofereceu Tino.

— Minha gratidão — disse Ansem, inclinando levemente a cabeça.

Eu já tinha causado muito mais problemas para ele do que ele para mim. Cavar uma fonte termal não era nada.

Vamos lá, comecem a cavar! Agora é a hora de usarem esses corpos estupidamente poderosos! Isso é bem mais fácil do que lutar contra monstros!

Liz pulou agilmente do ombro de Ansem, e Luke arregaçou as mangas.

— Líder, tem mais coisa envolvida além de cavar. Precisamos de algo para bombear a água — disse Lucia.

— Ah. Por que não usamos aquele feitiço? Sabe, aquele que você me mostrou anos atrás. O que cria fontes.

Era um feitiço que fazia a água jorrar do chão. Pedi para Lucia criar esse feitiço porque queria testar as possibilidades da magia. Vale mencionar que lembro dela reclamando disso. Algumas coisas nunca mudam.

Lucia pareceu incomodada com a lembrança.

— Depois usamos esse feitiço para destruir um castelo — ela disse.

— Então por que não ajustamos a força? Tenho certeza de que vai dar certo. Até agora sempre deu.

— Isso porque fui eu que fiz dar certo.

— Bom, não vejo ninguém melhor para ficar encarregada da construção em larga escala — disse Sitri. — Nós cuidamos dos detalhes. Isso não deve levar mais do que alguns dias. Depois podemos contratar alguns trabalhadores para corrigirem nossos erros enquanto relaxamos.

Como sempre, ela dirigia as coisas muito bem. Fazia tempo que eu não via todos nós trabalhando juntos assim. Normalmente, eu só ficava sentado, assistindo, porque não conseguia fazer nada útil, mas hoje estava com vontade de trabalhar.

Corri pelo terreno de Sitri e parei perto do centro.

— Certo, Lucia. Por enquanto, comece a cavar bem aqui!

— Aí está você de novo, falando o que bem quer…

— Não se preocupe, Lucy. Você pode encontrar água quente cavando praticamente em qualquer lugar desta região. E se não der certo, é só tentar de novo até conseguirmos.

Lucia aceitou o raciocínio de Sitri e começou a caminhar em minha direção, embora com relutância. Era só parte da sua fase rebelde.

Segundo a pesquisa de Sitri, este incidente foi o único caso de trabalhadores da construção civil encontrando túneis de Trogloditas, então podíamos ficar tranquilos quanto a isso. Entre isso e o dragão da fonte termal, eu não tinha certeza se minha sorte poderia piorar ainda mais.

Lucia respirou fundo, abriu os olhos e começou a entoar uma invocação. Não havia vento, mas seus longos cabelos começaram a flutuar levemente. Mesmo eu, que praticamente não tinha habilidade para sentir mana, conseguia perceber que ela estava reunindo uma grande quantidade e a moldando em um feitiço.

Engoli seco e fiquei observando, esperando que a água quente jorrasse. Mas, por mais que esperasse, nada aconteceu.

— Hã? Cadê a fonte termal? — perguntei.

— Cavei cerca de dois mil metros, mas não encontrei uma nascente — explicou Lucia. — Um erro, como eu esperava.

O que você quer dizer com “como eu esperava”?

Essa era uma área onde se supostamente encontraria uma fonte praticamente em qualquer lugar. Que decepção. Claro, bastava cavarmos em outro ponto, mas minha sorte era horrível. Até mesmo Sitri exibiu um sorriso amarelo. Espiei dentro do buraco. Como esse foi um erro, comecei a me perguntar se todo o terreno não era problemático.

Mas então, um tentáculo familiar surgiu do buraco e se agarrou ao chão. Dei de cara com uma criatura que eu já estava farto de ver.

— Ryuu — disse o Troglodita.

— Ryu-u — respondi automaticamente.

Sem hesitação, Lucia chutou o tentáculo para longe. O apêndice macio, porém resistente, desapareceu silenciosamente pelo buraco.

Lancei um olhar para Sitri, como quem diz: Achei que não precisávamos nos preocupar com isso. Ela apenas sorriu, como se achasse que a culpa era minha ou algo assim.

— Por que isso sempre acontece com você? — Lucia reclamou. — Vou fechar o buraco. Alguma objeção?

Luke e Liz jogaram suas pás de lado e correram até o buraco.

— Espera aí, Lucia! Aquilo era um Habitante das Cavernas, né? Era, não era?! Eu vou descer lá!

— Espera, Lucy! Eu quero ver o reino subterrâneo do qual o Bebê Krai falou. Vamos, T, estamos indo!

Decidi não me preocupar com isso e, em vez disso, me concentrei no quanto queria aproveitar uma fonte termal com todos.

Liz e Luke, sem precisar fazer sua patrulha habitual, brincavam enquanto Sitri e Lucia trabalhavam. Ansem usava sua magia para recuperar a energia deles, e Tino enchia a boia de piscina que Luke trouxe para mim. Foi muito gentil da parte dele lembrar que eu gosto de boias.

A segunda tentativa de Lucia tinha sido bem-sucedida, e um reservatório de água estava se formando. Sitri cantarolava alegremente enquanto usava poções para endurecer o chão. O terreno ao redor do local onde Sitri trabalhava se elevava, formando uma parede que até mesmo Ansem poderia se esconder atrás. Era mais alta que o muro ao redor de Suls.

— Mestre, hum, que tipo de magia a Lucy está usando? — perguntou Tino enquanto continuava a encher a boia.

— Hm? Não faço ideia.

Tino pareceu alarmada com isso.

Eu não era um especialista em magia. Tudo que eu sabia era que Lucia era incrível, e praticamente qualquer coisa era possível quando ela e Sitri trabalhavam juntas. Bom, eu sabia que ela estava combinando feitiços já existentes.

— Isso acontece o tempo todo. Uma vez, ela construiu um palácio no deserto.

Tenho certeza de que algumas pessoas conseguiriam construir estruturas melhores, mas duvido que alguém fosse mais rápida que Lucia.

Sitri plantava sementes que cresciam em árvores, que os golens cortavam. Com magia, a madeira era aparada e seca, depois montada sobre uma grande fundação. Eu me divertia só de assistir a todo o processo.

Uma quantidade de água quente suficiente para quase encher um lago havia sido coletada. Eu não precisava entrar para saber que estava claramente quente demais para seres humanos. As vestes de Luke inflaram com o ar quente quando ele pulou na água. Gotas espirraram em Tino, que soltou um gritinho.

— Aaaah! Krai, está quente! — gritou Luke. — Ah, já entendi. Isso é mais um treinamento! Nossa, queima. Me faz lembrar daquele cofre do tesouro na cratera vulcânica. Ah, Lucia, não abaixe a temperatura!

— Este é um treinamento meu — respondeu Lucia.

— Hm? É mesmo? Droga, não posso argumentar contra isso. Vou ceder, só dessa vez. Mas não serei tão gentil da próxima!

Energia de sobra, como sempre.

Eu bocejei enquanto flutuava na boia. O cheiro característico de uma fonte termal pairava no ar. Justo quando comecei a cochilar, ouvi algo que realmente não queria ouvir. Me ergui e olhei na direção da entrada, o único ponto aberto na parede. Luke ficou animado.

Parada ali estava a princesa Troglodita e sua comitiva.

A princesa me encarava intensamente.

Luke observava inquieto.

Incapaz de suportar a tensão, me virei para Sitri.

— Achei que você tinha selado aquela passagem.

— Eles devem ter cavado outro túnel — ela disse.

Eles conseguem fazer isso? Parece claustrofóbico.

A princesa juntou as pequenas mãos e fez um som simples.

— Ryu-u.

Sitri traduziu:

— Ela disse: “Graças a estes súditos aprimorados por nosso rei, agora conseguimos cavar através da rocha sólida.”

Em vários níveis, eu tinha dificuldade em acreditar nisso. Como a princesa conseguia transmitir tanto significado com tão poucos sons? E além disso, o conteúdo das palavras era chocante. Será que, sem querer, eu tinha dado uma nova arma para os Trogloditas? E agora que eles podiam subir à superfície quando bem entendessem, o que faríamos?

Os Trogloditas não eram tão fortes, mas ainda eram bem mais poderosos que um humano comum. Eram inteligentes o bastante para causar um grande estrago se quisessem.

Eu pedi para Sitri dizer a eles que não havia necessidade de me agradecer e que apenas voltassem para casa.

— Perdão — ela respondeu —, minhas cordas vocais não são adequadas para o idioma deles.

Então o que diabos eu estava dizendo esse tempo todo?!

Lucia me lançou um olhar gélido. Isso não era bom. A opinião dela sobre mim já era baixa o suficiente.

A princesa, no entanto, manteve-se calma. Ela fez outro som breve, e Sitri traduziu de novo, sempre eficiente.

— Ela disse: “Você nos salvou daquele deus maligno. Você pode não ser um de nós, mas sem dúvida é o nosso rei.”

— Muito bem, Krai Baby! — gritou Liz. — Você deve ser o primeiro humano a virar rei dos Homens das Cavernas.

Eu apreciava o otimismo dela, mas tinha certeza de que a pura estupidez da situação foi o que me permitiu ser o primeiro.

Quero dizer para eles voltarem para casa.

— “Aguardamos suas ordens, Vossa Majestade. Se for por seu bem, devastaremos até mesmo a terra natal do deus maligno.”

Quero dizer para eles voltarem para casa.

Percebi que os guardas da princesa pareciam estar alertas com algo. Talvez nunca tivessem voltado à superfície se não fosse por mim. Ao contrário de seus guardas, a princesa observava o local com curiosidade.

— Ela diz: “Vossa Majestade, estou enganada ou você está construindo um palácio?”

Não. Do que você está falando? Isso é uma fonte termal.

Me ocorreu que, no subterrâneo, havia água quente e magma correndo. Talvez os Trogloditas tivessem alguma conexão especial com fontes termais? Não que isso fizesse diferença.

— Ela diz: “Aguardamos suas ordens, Vossa Majestade. Construiremos um palácio muito superior a qualquer coisa que esses humanos tolos possam fazer.”

Não precisa fazer isso. E a Sitri realmente sabe se virar no idioma deles.

A princesa juntou as mãos e fez um ryu-ryu suplicante para mim.

— Ela disse: “Por que me ignora?”

O que eu poderia dizer? Olha só o que aconteceu da última vez que falei qualquer coisa sem pensar. Eu não queria irritar os Trogloditas uma segunda vez.

Me virei para meus amigos. Luke e Liz me olhavam ansiosos. Lucia me encarava com desaprovação silenciosa. Sitri sorria. Ansem apenas ficava ali sentado, como sempre.

Respirei fundo. Estava determinado a dizer para a princesa ir embora.

— Ryuu-ryuu-ryuu-ryu-ryu — falei.

Os olhos da princesa se arregalaram. As sobrancelhas de Sitri estremeceram, e ela me olhou desconfortável. Mantive um sorriso no rosto, me perguntando o que diabos eu tinha acabado de dizer.

— Krai — disse Sitri, com uma voz aterrorizada. — Por que você ordenou que eles cometam um massacre?

Por que tinha que ser tão específico?! Espera, pera aí.

A princesa piscou, confusa, com uma expressão incrivelmente humana. Então, inclinou levemente a cabeça e soltou um ryu-ryu animado, sorrindo.

— Ela disse: ‘Entendido. Você solicita nossa assistência.’

Apesar da minha confusão, de alguma forma eles me entenderam. Isso era assustador pra caramba.

— O-O-O que é isso?! — alguém gritou.

Chloe e alguns caçadores tinham acabado de chegar e encaravam nosso banho termal com descrença. A construção no terreno da Sitri estava avançando a um ritmo impressionante. Eu não entendia aquilo melhor do que eles.

— Esses Homens das Cavernas são incríveis — disse Luke.

— É a primeira vez que vejo Trogloditas. Eles são ainda mais coordenados que o Barrel — comentou Sitri, igualmente impressionada.

Ela não estava errada. Os Trogloditas se moviam como se fossem um só. A princesa havia chamado uma horda imensa de seus semelhantes, e um único comando foi o suficiente para colocá-los para trabalhar. Eles cavavam a terra, a compactavam, quebravam pedras que tinham conseguido de algum lugar e as empilhavam. Era como magia, exceto pelo fato de que não era magia.

— Trogloditas não podem usar magia — lembrou Sitri.

— E nem precisam — respondi.

— Será que eles gostam de espadas? — Luke se perguntou, genuinamente desapontado.

Foi aí que percebi que os Trogloditas não usavam armas. Mas eu não queria que ficassem ainda mais fortes, então silenciosamente implorei para que Luke parasse.

Graças às suas extensões capilares, eles construíam em um ritmo absurdo. Mesmo com uma multidão de habitantes da cidade reunida para observar, os Trogloditas não se distraíam nem por um instante.

Que diabos são essas criaturas? E tem tantas delas. Quantos a princesa invocou? Provavelmente há ainda mais que não conseguiram subir e ficaram no subterrâneo.

— Ainda bem que não vivem na superfície — comentei.

— Poderíamos nos tornar amigos deles, mas acabariam nos dominando por meios civis — murmurou Tino.

Isso não parecia muito divertido.

O edifício que estava surgindo diante dos meus olhos era magnífico, ainda que um tanto diferente da arquitetura humana comum. Nosso plano era usar madeira, mas os Trogloditas trouxeram pedras lustrosas de algum lugar, tornando a construção desnecessariamente austera e imponente.

Pensando bem, não disseram que isso seria um palácio ou algo assim?

Enquanto observava a construção, a princesa assentiu, satisfeita, antes de parecer se lembrar de algo e se aproximar de mim.

— Ryu-u? — disse ela.

— Ryuu — respondi.

— De novo, Krai, por que você está ordenando massacres? — perguntou Sitri.

Eu não estou! E isso foi claramente diferente do que eu disse antes!

A princesa inclinou a cabeça e deu algumas ordens, e de repente metade dos Trogloditas disparou. Do lado de fora da construção, Chloe soltou um gritinho quando um Troglodita macho passou correndo ao seu lado.

— Devemos nos preocupar com isso?

— Parece que vão consertar as casas destruídas pelo Dragão do Banho Termal.

Então, não precisávamos nos preocupar. O elemento mais preocupante era eu—o cara que acidentalmente ordenava massacres.

— Ela é bem parecida com você, Siddy — disse Liz, exasperada. — Sempre desesperada para ganhar o favor do Krai Baby.

Que coisa horrível de se dizer.

Quando o sol começou a se pôr, a construção da mais extravagante estalagem de águas termais de Suls—não, do palácio de águas termais—foi concluída.

— Ryuuu! — a princesa gritou triunfante.

Seus súditos responderam com entusiasmo. Um tentáculo se estendeu na minha direção e eu, por puro instinto, bati um high-five nele.

Diante de nós, erguia-se um edifício branco como giz, no que antes era apenas um terreno vazio. Era uma construção peculiar, misturando madeira e pedra branca brilhante. Os Trogloditas tinham preenchido o teto com rochas cintilantes, que funcionavam como fonte de luz.

A largura e a altura do prédio eram mais do que suficientes para acomodar Ansem. Em um testemunho do poder do número absoluto, isso era muito mais do que Sitri e Lucia poderiam ter conseguido, mesmo que dessem o máximo de si.

Assim como o exterior, o interior era deslumbrante. Os Trogloditas claramente tinham talento para arquitetura. Canos saíam de algum lugar, transportando água quente de um ponto desconhecido e enchendo uma enorme banheira. Sitri havia supervisionado a construção do sistema de drenagem, mas ainda assim era impressionante.

Espera aí, por que tem quartos com tatames? E não é estranho que tenham usado madeira? Esses caras não vivem no subterrâneo? E esses quartos são muito mais sofisticados do que os que vi no reino deles.

— Parece que eles pegaram referências das construções de Suls — explicou Sitri.

A essa altura, eu estava mais assustado do que impressionado.

— Krai, você poderia me ensinar a pronunciar corretamente o Trogloditês? — ela perguntou em um tom baixo. — Eles saem bem mais baratos do que golems…

Eu te ensinaria se soubesse, mas eu não sei.

A princesa gritou algo e a maioria dos Trogloditas correu para longe. Ou melhor, para os andares inferiores do palácio. Em algum momento, eles haviam construído uma escadaria em espiral debaixo da estrutura. Olhei para baixo e não conseguia ver o fim.

Será que isso vai até o—

— Parece que eles também aprenderam sobre escadarias — comentou Sitri.

Parei de pensar no assunto. Afinal, ninguém podia deter os Trogloditas agora que eles eram capazes de perfurar rochas maciças. Não valia a pena ficar refletindo sobre isso, então simplesmente parei. Eu ia aproveitar as novas águas termais.

Muita coisa havia acontecido, mas umas férias como essas tinham seus próprios méritos. Bocejando, olhei para baixo do meu poleiro para o grande banho recém-construído. O prédio era menos uma pousada e mais um hotel, e aquilo diante de mim era menos um banho e mais uma piscina, mas eu não iria ser implicante. Uma abertura no teto servia como ventilação, dispersando todo o ar quente. Que espaço agradável.

Para os Grieving Souls, causar comoção havia se tornado parte de nossas vidas. Eu adorava festivais. Luke e Liz adoravam se divertir. Sitri não odiava e Ansem era um irmão gentil que colocava suas irmãs mais novas em primeiro lugar. E Lucia sempre nos repreendia.

Costumávamos comemorar em uma escala menor, mas tudo aumentou conforme nossa riqueza e poder cresceram. De modo geral, caçadores gostavam de prazeres passageiros, mas nenhum deles festejava na mesma escala que nós. E eu achava isso perfeitamente normal.

Já fazia um bom tempo desde que parei de caçar tesouros. Como nosso tempo juntos era tão breve, precisávamos compensar isso com qualidade.

Tino ficou bastante surpresa. Provavelmente nunca tinha visto um banquete tão grandioso antes. Acenei para ela e ela correu até mim como um filhote, sentando-se ao meu lado.

— Bom trabalho lá fora, Tino. Tire um descanso merecido.

— S-Sim, Mestre! Isso é realmente algo incrível.

Talvez devido ao vapor, suas bochechas ficaram levemente coradas.

De uma varanda elevada, eu podia observar todo o palácio das termas. Os Trogloditas haviam construído instalações enormes, todas conforme os gostos pessoais de cada um dos Grieving Souls. Em termos de área e número de banhos, este lugar superava até as pousadas mais luxuosas em que havíamos ficado.

Fiquei me perguntando se as fontes termais eram parte essencial da vida dos Trogloditas. Havia vários tipos de banhos diferentes, incluindo um grande o suficiente para Ansem, um raso, um no qual se podia deitar, além de banhos com temperaturas variadas.

O trabalho foi dividido: os Trogloditas cuidaram da maior parte da construção, Sitri projetou o sistema de drenagem e Lucia usou sua magia para ajustar as temperaturas. Para encher o ambiente de vapor, canais de água quente corriam por toda parte. Isso realmente parecia algo que os Trogloditas teriam idealizado.

O olhar de Tino caiu sobre o centro do banho principal.

— M-Mestre, o que é aquilo? Aquela cachoeira?

— É uma cachoeira.

Luke estava de pé sob uma cachoeira no meio do banho principal. Que maluco. A fonte daquela torrente era uma nascente bombeada para cima por magia. Isso era possível graças ao elemental com o qual Lucia havia firmado um contrato. Luke parecia bastante satisfeito com isso, embora eu mal pudesse ver seu rosto em meio à água.

— Normalmente, um humano só pode firmar contrato com um único elemental, e vice-versa — disse Lucia, cansada de tanto conjurar magia. — Então eu sempre me pergunto: será que alguém mais já fez um contrato com um espírito da água só para treinar debaixo de uma cachoeira?

— Não é culpa minha que isso aconteceu — respondi.

— É porque você vive colocando ideias malucas na cabeça do Luke! Honestamente, o que ele quer dizer com treino e cachoeiras andam juntos?

Está sendo útil, então não vejo problema. Água é bom. Eu gosto de água. Quero fazer um contrato.

Infelizmente, firmar um contrato com um elemental era um dos maiores desafios que um mago poderia enfrentar. Eu não sabia os detalhes, mas, embora tomar emprestado o poder de um elemental não fosse tão difícil, comandá-lo era aparentemente bem mais complicado.

— M-Mestre, e aquele banho ali no canto? Aquele com o redemoinho.

— É um banho de hidromassagem.

Manter um hidromassagem consumia bastante mana, mas as reservas de Lucia eram mais do que suficientes. Exatamente o que se esperaria da minha irmãzinha.

— Krai Baby, trouxemos a comida e a bebida!

Liz entrou animada, rolando três grandes barris para dentro do salão. Eles estavam cheios de álcool e eram grandes o suficiente para caber uma pessoa dentro. Parecia que ela estava no clima para beber. Atrás dela, Ansem carregava duas mesas empilhadas com comida, e alguns dos nossos novos amigos cinzentos traziam outras mesas com seus tentáculos.

Hmm. Achei que este lugar fosse bem espaçoso, mas talvez não tanto assim?

Era suficiente para nossa festa e ainda havia um segundo e terceiro andar, mas havia muita comida e os Trogloditas estavam se juntando a nós.

Bom, se ficarmos sem espaço, damos um jeito.

Eu estava entrando no clima festivo quando Sitri chegou carregando um monte de fogos de artifício.

— Krai, comprei fogos de artifício.

— Ooh, ótima ideia.

Perfeito. Essas eram as férias que eu esperava. Eu estava com meus amigos em uma fonte termal, com comida, bebida e até fogos de artifício. Teria sido ainda melhor se Eliza estivesse aqui, mas não fazia sentido tentar segurar nosso espírito livre número um.

Todos estavam reunidos e a comida estava servida. Eu não conseguia ver a paisagem além das grandes paredes, mas a lua brilhava no céu. Era hora de começar minhas férias. Com um olhar sério no rosto, levantei-me, boia na mão.

— Hum, Mestre, só tem banho masculino? — Tino perguntou, como se só tivesse percebido agora.

— Ah, fazemos banho misto. Se deixar essas coisas te incomodarem, nunca vai conseguir tomar banho ao ar livre, sabia? Estamos atrás de muros, então não deixe isso te afetar.

Tino congelou.

— Hã?

Costumávamos nos separar, mas uma vez Liz pulou o muro, o que levou Sitri e Lucia a derrubá-lo. Dividir o espaço só deixava menos área para Ansem, e nós éramos mais ou menos uma família, então isso realmente não importava. Em vez disso, apenas tomávamos cuidado com os bons modos. Os Trogloditas também pareciam totalmente tranquilos com esse arranjo.

— Muito bem, Tino, hora do treino! Ao fortalecer sua vontade, você pode cortar a dos seus inimigos! — Luke disse ao sair casualmente debaixo da cachoeira.

Tino ficou completamente chocada com o que viu.

Luke estava completamente nu. Uma nuvem de vapor cobria sua cintura, mas ele ainda deveria ter demonstrado um pouco mais de decência ao invés de simplesmente ficar ali de braços cruzados. Nem dava para dizer que ele parecia estiloso, já que seu cabelo molhado estava grudado na cabeça.

O rosto de Tino ficou completamente vermelho, ela soltou um grito estranho e se escondeu atrás de mim. Ainda tinha um longo caminho a percorrer antes de viver como os Grieving Souls.

E assim começaram nossas férias.

O vapor impregnava o palácio, obra-prima dos Trogloditas, e mesas repletas de comida e bebida estavam logo ao lado dos banhos.

— Krai, arruma um dragão pra mim também! — Luke disse antes de pular direto nos banhos, gritando alto o suficiente para acordar os vizinhos. Ele espirrava água para todos os lados, mas ninguém ali iria repreendê-lo por algo assim.

Liz franziu os lábios e desfez o nó do cinto do robe, deixando-o escorregar até o chão. Sua pele bronzeada brilhava sob a luz das chamas e das pedras luminosas. Aparentemente, ela não estava usando nenhuma roupa íntima.

Ela não hesitou nem um pouco, mesmo tendo sido tão envergonhada lá nas montanhas Galest. Justamente por estarem sempre escondidas, a visão de suas pernas era um tanto cativante. Apex Roots era um belo acessório quando estava em repouso.

— Luke, eu queria entrar primeiro! — Liz gritou ao se jogar na água.

— Lizzy?! V-Você não devia fazer isso com o Krai bem aqui! — Tino exclamou. Se alguém estava embaraçada com a situação, era ela.

— Cala a boca, T! Não adianta ter vergonha depois de tantos anos! Um pouco de pele não faz diferença entre a gente. Se não quiser entrar, então vai fazer outra coisa.

— Isso é—

— Liz — interrompi.

— Mestre! — Tino sorriu, aliviada por alguém finalmente ter vindo ao seu auxílio.

Joguei uma esponja macia para Liz.

— Você precisa se lavar antes de entrar.

Os olhos de Liz brilharam.

— Okaaaay! Eu sabia que você me entenderia!

— Mestre?! — Tino lamentou.

Liz tinha razão. Infelizmente, já era tarde demais para se preocupar em mostrar pele. Nós nos conhecíamos há muito tempo e ela nunca foi do tipo envergonhada. No passado, já tinha invadido o banho masculino sem hesitar. Não fazia isso o tempo todo, mas se tivesse vontade, simplesmente entrava. E com sua velocidade absurda, expulsava qualquer um que estivesse no caminho.

Seu traje habitual já deixava boa parte de seu corpo à mostra, e essa não era a primeira vez que tomávamos banho juntos em uma fonte termal. Em resumo, ela estava mais do que acostumada a ficar nua. E tudo bem, desde que não começasse a se agarrar nos outros.

Liz pode não ter muitas reservas quanto ao contato físico, mas isso não era problema enquanto Lucia estivesse por perto. Nossa Maga simplesmente lançava um feitiço para afastá-la e até criava filtros visuais. Por enquanto, ela apenas suspirou e não fez nada além disso.

Tino parecia estar tendo um choque cultural, mas isso era inevitável agora que tínhamos construído uma fonte termal.

— Aqui, todos somos iguais. Coma, beba e aproveite.

— T, só pra deixar claro, você não precisa ficar nua — Sitri apontou.

— Você pode usar uma toalha ou um maiô. Se quiser, até pode entrar na água com as roupas.

Eu simpatizava com o dilema de Tino. Havia duas feras sem maiô, sem toalha e sem a menor preocupação com isso, mas era melhor ignorá-las. Elas eram praticamente animais selvagens. Tino só precisava fazer o mesmo. Até os Trogloditas aprimorados, que ficaram depois da construção, estavam nadando por ali.

— Olha, Krai! Eu consigo ficar de pé debaixo de uma cachoeira caindo direto sobre mim! Isso é o resultado do meu treinamento! Minhas pernas e meu quadril estão mais fortes do que nunca! — Luke gritou, todo orgulhoso, enquanto se equilibrava sob a queda d’água.

Só de vê-lo assim, já me senti de bom humor e mais relaxado. O ambiente estava quente demais, então desabotoei minhas roupas. Por ora, tirei apenas a camisa, o casaco e todas as minhas Relíquias, deixando apenas um Anel de Segurança. Com todos os meus amigos por perto, eu podia até abrir mão das Relíquias que usava até para dormir.

— M-Mestre, você também?!

Ainda tá se preocupando com isso?

Eu era o que menos ligava ali. Ninguém ia se incomodar só porque tirei a camisa. Além do mais, foi a própria Tino que destruiu uma parede para invadir o banho masculino mais cedo. Mas não era o momento de trazer essas lembranças de volta.

Ainda vestindo seu yukata, Lucia estalou os dedos e um copo se encheu sozinho antes de flutuar até mim. A bebida era doce e tinha um teor alcoólico baixo, então até eu podia apreciá-la. Aceitei o copo e levantei-o com gratidão, sorrindo.

— Entrar no banho logo depois de beber não é uma boa ideia.

— Então por que você pediu?

— Eu não pedi. Foi a Liz que trouxe sem nem me perguntar. Bom, tanto faz. Não vou me preocupar com isso hoje.

Levei o copo aos lábios e bebi tudo de uma vez.

— M-Mestre — Tino disse com renovada determinação —, eu vou me trocar.

— Aham.

Tino então correu e pegou uma toalha.

Sorri ao observar meus amigos se divertindo.

— Luciaaa, não tem corredeiras! Não dá pra treinar sem corredeiras! — Luke resmungou.

— Lucy, eu quero uma sauna! — Liz exigiu.

— Cale a boca! Já estou usando feitiços demais de uma vez! — a Maga retrucou.

Um barril enorme flutuou no ar e despejou seu conteúdo sobre Luke e Liz, encharcando-os de um dourado licor mais forte do que tudo o que havíamos bebido até então. Lucia era uma Maga habilidosa; nem uma gota caiu na fonte termal ou na comida.

— Qual é a dessa agora?! — Liz gritou, passando a mão pelo cabelo encharcado de álcool.

— Isso é para eu treinar Drunken Boxing? — Luke perguntou.

Ensopados de álcool, suas peles brilhavam, mas nenhum dos dois parecia minimamente afetado.

— Mestre, isso é o que chamam de ‘simpósio’?

Tino, eles pararam de chamá-los assim há muito tempo.

— Por que não come alguma coisa? — ofereci.

— Não consigo relaxar assim — ela respondeu.

Ela olhou para si mesma e seus ombros tremeram. Uma toalha longa estava enrolada ao redor de seu corpo, bem apertada para não cair. Não era muito mais reveladora do que as roupas usuais que ela usava, mas ainda assim parecia envergonhada. Talvez por causa do vapor, seus ombros estavam profundamente avermelhados.

Não muito longe de nós, Sitri usava uma toalha da mesma maneira que Tino e empunhava um esfregão. Ela se movia como se estivesse limpando uma parede grande, mas, na verdade, estava lavando as costas de Ansem.

— Obrigada por todo o trabalho duro lá fora. Você trouxe de volta? — ela perguntou.

— Mmm. Está na capital imperial — ele respondeu.

Sitri sorria satisfeita. Ela se importava profundamente com seu irmão mais velho, como ficava claro pelo uso de um banquinho para alcançar cada centímetro de suas enormes e musculosas costas.

As costas de Ansem estavam cobertas de cicatrizes, resultado de sua dedicação em assumir a dianteira e absorver os ataques inimigos. Ele era tanto nosso curandeiro quanto o principal pilar da defesa. Sua magia de cura era poderosa o suficiente para receber pedidos de algumas das pessoas mais influentes do império. Mas magia de cura era uma coisa complicada e não funcionava em quem a lançava.

Ele não parecia sentir dor, mas ainda assim eu me sentia culpado, sabendo que era graças a ele que eu nunca tinha me ferido. Levantei-me, carregando minha boia, e caminhei até Ansem, com Tino me seguindo como um patinho.

— Bom trabalho hoje, Ansem. Aqui, vou lavar suas costas, já faz um tempo — eu disse.

— Mmm.

— Tem certeza? — Sitri perguntou. — Bem, então, em troca disso, eu lavo as costas do Krai! Tudo bem para você, Ansem?

— Mmm.

Não entendi o que era “em troca de quê”, mas aceitei o esfregão de Sitri e dei uma boa esfregada nas costas de Ansem. Eu não servia para nada durante as caçadas, mas sabia lavar uma parede tão bem quanto qualquer outra pessoa. Os relevos dos músculos dele dificultavam um pouco, mas coloquei força e esfreguei com empenho. Era cansativo, mas eu tinha uma fonte termal me esperando quando terminasse. E como eu nunca fazia trabalho algum, era até divertido.

— Mestre, hum, posso fazer isso? — Tino perguntou. — Tudo bem, Ansem?

— Mmm.

Mesmo depois de todos esses anos, Ansem ainda era um homem de poucas palavras. Mas eu podia dizer, pela voz, que ele estava feliz por ter tantos amigos por perto.

Luke e Liz correram para cá assim que perceberam que eu estava passando o bastão — ou melhor, o esfregão — para Tino.

— Isso não vale! Isso é algum tipo de treinamento? É, né?! Deixa eu tentar! — Luke gritou.

— Se agora é a vez da T, então é natural que eu venha depois! Você pode se contentar só com uma bebida, então toma! Esse é outro tipo de treinamento! — Liz disse, empurrando um caneco meio vazio para Luke.

— Você acha que eu vou acreditar que existe um treinamento que envolve só beber?! Tá me achando com cara de idiota?

— Então você escuta o Krai Baby, mas não a mim?

— Bom, é, eu não confio em uma palavra do que você diz!

Luke, não é como se você me ouvisse também. Acho que confiar em mim é uma ideia ainda pior do que confiar na Liz.

Enquanto Ansem permanecia completamente imóvel, aqueles dois continuavam discutindo, como sempre faziam. Essas brigas eram a prova da força do laço entre eles.

— Deixa eles pra lá, Krai. Agora, permita-me lavar suas costas. Nunca fiz isso antes — Sitri disse, particularmente animada.

— Siddy! Você está muito—

Antes que o peito de Sitri encostasse em mim, ela foi arremessada para longe. Seu corpo girou no ar e mergulhou de cabeça na fonte termal, espalhando água para todos os lados.

Tino ficou ali, paralisada.

— Isso é um cartão vermelho, Siddy — Lucia disse, segurando um caneco distraidamente com uma das mãos. — Sério, não posso tirar os olhos de vocês nem por um momento.

— Lucy, isso foi… Você usou um feitiço de ataque?

— Foi por culpa de vocês que fiquei tão forte! Tem ideia do quanto eu odeio ser perguntada sobre como fiquei tão poderosa?! — ela disse, mordiscando uma coxa de frango.

Lucia não segurava bem a bebida (embora fosse melhor do que eu), e o que Liz bebia sem problemas a fazia apagar. Tomar poções de mana parecia piorar ainda mais a situação. E ainda assim, mesmo embriagada, minha irmã mais nova conseguia usar magia sem dificuldades. Isso não era incrível? Impressionante?

— Mestre, se aquele feitiço fosse em mim, eu teria morrido! — Tino lamentou.

— Não se preocupe, ela pegou leve.

Além disso, você não vai ser atingida se não fizer nada idiota. Eu nunca fui atingido porque sou um homem cuidadoso.

Tremendo, Sitri segurou a borda do banho e se ergueu. Sua toalha tinha sido arrancada e nada cobria sua pele levemente corada.

— Mas que droga! Todo esse esforço e nem uma recompensa! Por que eu preciso da sua permissão pra lavar as costas do Krai?!

A situação ficou tensa quando Lucia cruzou os braços e se colocou no caminho de Sitri.

— Se quiser se agarrar a ele, posso te transformar numa toalha — Lucia ofereceu. — Não posso garantir que conseguirei reverter depois.

— Eek!

— Ah! Sitri, torne-se uma toalha! — Lucia entoou.

— Aaaaah!

— Torne-se uma toalha! Torne-se uma toalha! Ah, não existe esse feitiço!

O sangue sumiu do rosto de Sitri e ela começou a nadar desesperadamente. Lucia terminou a carne que estava comendo e reduziu o osso restante a cinzas. Ela tirou o yukata e foi atrás de Sitri. O tempo todo, raios saíam da nuvem que ela usava para gerar a cachoeira. Tino observava apavorada.

— E-eu nunca ouvi a Siddy gritar. E a Lucia…

Lucia e Sitri eram muito boas amigas, entende?

— Ansem, já está bom? — perguntei.

— Mmm.

Ignorando Liz e Luke, que ainda discutiam sobre o esfregão, Ansem lentamente se abaixou na água quente. Segurando minha boia, fui atrás dele.

Deitado sobre minha boia, flutuava suavemente pela água. Tino usou uma corda para amarrar minha boia a um pilar para que eu não fosse puxado para muito longe. Não sabia se isso faria alguma diferença.

Ouvir meus amigos brincando e olhar para a lua era uma sensação maravilhosa. Ao meu lado, Tino estava sentada com um ar sombrio, a água cobrindo até sua boca.

— Nunca fui a algo tão animado — murmurou.

Luke e Liz estavam competindo em corridas de natação. Sitri e Lucia relaxavam na água e pareciam estar em uma disputa de bebida. Ansem estava com os olhos fechados, sentado silenciosamente na parte mais profunda do banho. Não conseguia dizer no que ele estava pensando, mas parecia satisfeito.

Apesar de ser uma viagem de férias, muitas coisas aconteceram. Teve a tempestade, a perseguição de Arnold, o aparecimento do dragão e os Trogloditas. Tivemos nossos problemas, mas olhando para trás, foram boas lembranças. Fiz Tino passar por vários perrengues, mas esperava que ao menos essa viagem fosse agradável para ela.

Caçar relíquias era um trabalho perigoso, mas não deixava de ter seus momentos divertidos. Eu não tinha talento nenhum, então já tinha desistido de acompanhar meus amigos, mas tinha certeza de que uma garota talentosa como Tino teria muitas experiências incríveis no futuro.

— Tino, você se divertiu?

— Hã?! — ela soltou um grito, pega de surpresa pela minha pergunta repentina.

Várias emoções passaram por seu olhar, como se estivesse relembrando tudo o que havia acontecido. Esperei silenciosamente por sua resposta. Eventualmente, suas bochechas coraram e ela afundou um pouco mais na água, acenando algumas vezes.

Acho que foram boas lembranças. Que alívio.

Tudo está bem quando termina bem. Agora só faltava comprar lembrancinhas para todo mundo na capital. Então eu poderia me gabar de toda a viagem. Pelo que parecia, várias coisas aconteceram enquanto estávamos fora, mas os convidei para virem junto e foram eles que recusaram.

Pensei em sair do banho depois de um tempo. Então tomaria algo, assistiria aos fogos de artifício e voltaria para a água. Minha esperança era que até lá Liz e os outros já tivessem se acalmado.

A princesa e parte de seu grupo nadaram até mim. Pelo visto, os Trogloditas também eram fãs de águas termais, porque pareciam completamente satisfeitos.

— Ryuu-ryuu — disse ela.

Eles me assustaram quando os conheci, mas agora pareciam até adoráveis. Comparado a eles, nosso outro amigo cinzento, Matadinho, era muito mais assustador.

Provavelmente imitando Sitri e Lucia, a princesa usou uma bandeja flutuante para servir uma bebida.

Falando em coisas cinzentas, o que será que aconteceu com Gray?

— Mestre, deixe-me servir uma bebida para você!

— Ryuu-ryu!

Sorri enquanto via Tino e a princesa brigando pela garrafa. Parece que eu estava bem popular. De repente, um dragão azul-claro apareceu, puxando-me de volta à realidade.

O que você está fazendo aqui?! Você não voltou para casa? Para as montanhas? Onde está a segurança desta cidade?!

Mas não queria estragar as férias, não depois de tudo que aconteceu. Com Lucia por perto, imaginei que ficaria tudo bem.

O dragão me olhou e soltou um grito, como se estivesse me cumprimentando. Todos os olhares imediatamente se voltaram para ele. O mais rápido foi Luke, que parecia ter encontrado um novo brinquedo. Lucia, por outro lado, manteve uma expressão impassível. Mas a reação mais intensa veio dos Trogloditas. A princesa saltou, derrubando a bandeja flutuante.

— Ryu-u-u-u-u! Ryu-u-ryu-u! — ela gritou, seus olhos arregalados de pânico.

Os outros Trogloditas gritaram em resposta. O dragão das águas termais olhou ao redor, confuso. Isso não era bom. Pelo visto, os Trogloditas tinham medo até de dragões jovens. Se eu não fizesse algo, a viagem inteira seria arruinada.

— Ryu-u-u-u-u-u! — tentei acalmá-los.

Lucia ficou completamente chocada ao ver a princesa enrolar o cabelo ao meu redor e pular. Os outros Trogloditas seguiram logo atrás.

— Krai, o que quer dizer com passar o resto da sua vida no subterrâneo?! — gritou Sitri.

— Eu nunca disse nada disso-ryu!

A princesa e seu grupo dispararam para longe, com Luke e os outros correndo atrás. O jovem dragão das águas termais soltou um grito surpreso e o dragão adulto sobrevoou o local.

Sem poder fazer nada, fui mais uma vez arrastado para baixo, rumo ao reino subterrâneo.


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