Hai to Gensou no Grimgar â CapĂtulo 8 â Volume 14
Hai to Gensou no GrimgarGrimgar of Fantasy and Ash
Light Novel Online – CapĂtulo 08:
[A Canção Deles (Honestidade)]
Era uma vez um cantor fracassado.
No entanto, o cantor tinha dĂșvidas sobre isso. O que, exatamente, significava ser fracassado?
O cantor orgulhoso pensava, Minhas mĂșsicas nĂŁo sĂŁo algo pra ser vendido. Ă preciso uma alma empobrecida pra sĂł ver valor nas coisas com base em se elas dĂŁo dinheiro ou nĂŁo, nĂŁo Ă© mesmo?
MĂșsicas sĂŁo arte. Arte Ă© a busca pela beleza, e sua expressĂŁo. Beleza Ă© aquilo que transcende interesses pessoais mesquinhos e gostos para tocar o coração das pessoas. Esse sentimento de ser tocado Ă©, em si, beleza.
Porque as pessoas eram tocadas pelas mĂșsicas do cantor, e sentiam a beleza nelas, ele recebeu ofertas para formar uma banda e realizar shows.
Cada vez que alguém dizia que ia fazer uma fortuna, e o cantor era tratado como uma galinha dos ovos de ouro, ele inclinava a cabeça pro lado.
Que estranho, ele pensava. O dinheiro nĂŁo importa nadinha, nĂŁo Ă©?
Se o cantor pudesse cantar mĂșsicas que fizessem seu corpo inteiro formigar e sua alma se conectar com a plateia, isso era suficiente. Era melhor que fazer sexo com uma mulher. Era uma sensação tĂŁo incrivelmente maravilhosa que ninguĂ©m que nĂŁo tivesse experimentado poderia sequer imaginar.
O cantor criava mĂșsicas, cantava, cativava plateias e ganhava apoio massivo em certos cĂrculos. O cantor tinha colegas de banda, e sua relação com eles era boa, no começo, mas gradualmente ficou mais tensa. Isso porque, sempre que alguĂ©m trazia uma oferta que traria dinheiro para o cantor, ele os espantava.
Tanto o cantor quanto seus colegas de banda suavam muito no trabalho, depois usavam o tempo livre para praticar, e colocavam grande esforço nos shows.
Isso nĂŁo Ă© bom? pensava o cantor. Enquanto fizesse as coisas desse jeito, ele nĂŁo precisava cantar por dinheiro.
No entanto, seus colegas de banda aparentemente estavam insatisfeitos.
â A gente podia conseguir â eles afirmavam. â A gente podia ter sucesso. Podia viver da nossa mĂșsica.
Se fizessem isso, nĂŁo precisariam trabalhar, e poderiam se dedicar inteiramente Ă mĂșsica.
â Agora, escutem â alertava o cantor aos seus colegas de banda. â Se fizĂ©ssemos isso, as mĂșsicas, nossas performances, nĂŁo seriam mais puras. Se usarmos elas pra ganhar dinheiro, nĂŁo sĂŁo diferentes de qualquer outro trabalho.
Apesar disso, seus colegas de banda diziam: â Tanto faz. JĂĄ fomos o mais longe que podĂamos trabalhando em outros empregos. Vamos lĂĄ, vamos fazer isso. Vai dar certo. SĂł precisamos de um hit. A gente consegue.
Finalmente, o cantor cedeu. â TĂĄ bem, tudo bem. Em troca, vou fazer as coisas do meu jeito, como sempre. VocĂȘs tĂŁo de acordo com isso, nĂ©?
â Tudo bem â todos os colegas de banda concordaram.
E assim o cantor fez o que queria.
Quando se tratava das mĂșsicas, o cantor era sincero, e nĂŁo segurava os golpes. Ao escrevĂȘ-las, ele nĂŁo era sĂł sĂ©rio, mas desesperadamente sĂ©rio. Ele transformava apenas as coisas que realmente pensava e sentia em letras, transmitindo-as honestamente exatamente como eram. Ele era implacĂĄvel, e Ă s vezes cruel.
Se ele ia ser honesto, entĂŁo nĂŁo podia retratar nem mesmo uma mulher que amava do fundo do coração como apenas bonita. Havia momentos em que, depois que faziam amor, e ela caĂa num estado de sono desleixado, roncando alto, ele de repente sentia que a odiava.
Havia vezes que ele queria dizer, âComo vocĂȘ pode me dar essa gororoba nojenta?â e noites em que se masturbava pensando em outra mulher.
Mas neste momento, mais que qualquer um, mais que qualquer coisa, eu te amo! Gritar isso alto, sem vergonha, isso era honestidade. NĂŁo sei sobre amanhĂŁ. Talvez eu te jogue fora algum dia, como um lixo grande demais, mas por agora eu te amo.
Quando se tratava de seus colegas de banda, o cantor também não escondia nada.
â VocĂȘs sĂŁo uma droga. SĂł desistam. Por que nĂŁo conseguem fazer isso direito? Voltem e refaçam suas vidas algumas vezes. Eu gosto de vocĂȘs, mas agora, quero matar todos vocĂȘs. Quer dizer, vocĂȘs perderam o espĂrito. NĂŁo tĂŁo levando a sĂ©rio de jeito nenhum. Estou certo, nĂŁo Ă©?
E o cantor ocasionalmente gritava com eles.
â NĂŁo Ă© sobre dinheiro! NĂŁo tocamos mĂșsica por dinheiro, droga! Vou ceder um pouco, nĂŁo, bastante, e dizer que tĂĄ tudo bem se o dinheiro vier, mas nĂŁo coloquem o dinheiro na nossa frente. Se quisermos dinheiro, e sĂł estivermos fazendo isso pelo dinheiro, acabou. Isso nĂŁo Ă© mais mĂșsica. O valor de cantar, ou de ouvir, Ă© zero. Zero! Por que nĂŁo entendem? Estamos juntos hĂĄ todo esse tempo, entĂŁo quando foi que vocĂȘs viraram esse lixo? Se eu tivesse que escolher entre vocĂȘs e uma pilha de vĂŽmito, eu escolheria o vĂŽmito. Um monte de moscas voando ao redor de uma pilha de merda seria melhor que todos vocĂȘs agora. NĂŁo posso amar nenhum de vocĂȘs agora. Queria que todos vocĂȘs simplesmente morressem, sĂ©rio.
Dizendo, âNĂŁo aguento mais issoâ, um membro da banda saiu, depois outro, atĂ© que eventualmente o cantor ficou sozinho.
Com apenas um cantor, nĂŁo havia mais banda. Apesar disso, o cantor ainda se chamava de banda, colocando sua vida sinceramente nas mĂșsicas que escrevia, enchendo-as com todo o seu coração.
Ele cantava sobre amor e ódio, justiça e injustiça, a falsidade da moralidade, as contradiçÔes do mundo, verdade e mentiras, e liberdade. Ele fazia tudo isso sem medo, enfrentando as pessoas de frente.
â Sabe, todo mundo diz que gosta de mim â o cantor falou para a multidĂŁo. â Por que raios Ă© assim? O que tem de tĂŁo bom em mim? Que eu sei cantar? Que eu escrevo letras que ressoam com vocĂȘs? Sentem que eu falo por vocĂȘs? Ou Ă© porque ser o tipo de pessoa que gosta de mim faz vocĂȘs se sentirem especiais? Seja o que for, nĂŁo Ă© por isso que eu canto. Eu canto sĂł pra mim. Esses sĂŁo os meus sentimentos, nĂŁo os de vocĂȘs. Somos pessoas completamente diferentes. NĂŁo temos quase nada em comum, tĂĄ bom? Quando vocĂȘs falam como se me entendessem ou coisa assim, o que Ă© isso? Quer dizer, eu nĂŁo entendo nenhum de vocĂȘs, okay? Entender as pessoas nĂŁo Ă© tĂŁo fĂĄcil, Ă©? VocĂȘs tĂŁo realmente levando isso a sĂ©rio? NĂŁo posso prometer nada alĂ©m de que nĂŁo vou mentir pra vocĂȘs. O que acham disso?
Havia aqueles que viam o cantor como uma vĂtima do comercialismo, um mĂĄrtir pela arte, e o perdoavam.
Outros o condenavam, dizendo que ele era uma criança com um ego grande demais, um revolucionårio imaturo e wannabe, e um palhaço que entendia tudo errado.
Outros ainda diziam que o cantor pensava que era um gĂȘnio trĂĄgico, mas que a incapacidade de se adaptar ao mundo basicamente mostrava falta de talento, e, embora talvez ele tivesse lançado algumas boas mĂșsicas, previam, com risadas frias, que ele desapareceria, logo sendo esquecido.
â TĂĄ, deixa eles falarem o que quiserem â disse o cantor, descartando os crĂticos, retrucando-os em suas mĂșsicas.
Olho por olho, dente por dente.
Se não estavam prontos para levar um soco, não deveriam ter levantado os punhos em primeiro lugar. Eles achavam que estavam jogando pedras nele de longe, mas o cantor não era um espantalho que ficaria parado. Ele podia ir até eles e jogar pedras de volta.
â Se alguĂ©m te pega, vocĂȘ pega de volta. â Esse era o lema do cantor. Ele nĂŁo segurava o que pensava; ele colocava em palavras, e as afiava.
Quando as palavras do cantor se tornavam lùminas afiadas, ele não podia evitar machucar pessoas. No entanto, mesmo coisas ditas casualmente podem, às vezes, cortar profundamente o coração. Isso é o que significa ser humano. Ninguém pode viver sem ser machucado, ou machucar os outros.
Não é belo que, mesmo com nossos corpos e coraçÔes cobertos de feridas, pingando sangue, e quase morrendo de perda de sangue, ainda nos arrastemos para frente, sempre para frente?
Se alguém não quer ser machucado, deveria se enforcar e morrer. Aà nunca serão machucados de novo. Todos vamos morrer eventualmente, então hoje, amanhã, då no mesmo.
âComo ousam morrer assim!â AlguĂ©m pode ficar bravo. âPor que tiveram que morrer?â AlguĂ©m pode ficar triste. Mas os mortos nunca saberĂŁo disso.
Se dĂłi, se Ă© insuportĂĄvel, e nĂŁo aguentam, deveriam simplesmente fugir. Mesmo que as pessoas tentem impedi-los, nĂŁo hĂĄ como parar uma pessoa realmente decidida a acabar com a prĂłpria vida. A saĂda de emergĂȘncia conhecida como nossa prĂłpria morte estĂĄ sempre bem ao nosso lado, e Ă© uma opção realista.
Alguns dizem que Ă© um pecado grave, mas mesmo que vocĂȘ coloque o peso desse pecado na sepultura do falecido, sĂł os vivos poderiam se sentir enojados por isso, e os mortos nĂŁo sentiriam nada. Isso porque os mortos nĂŁo existem mais.
O cantor nunca disse uma vez sequer, âNĂŁo me critiquem, nĂŁo me batam, nĂŁo me chutem, nĂŁo joguem pedras em mim.â
â Façam o que quiserem. Digam o que quiserem. Me batam se quiserem. Podem me morder, e se quiserem esmagar minha cabeça com uma pedra, façam. Mas eu tambĂ©m vou fazer o que quero, e nĂŁo vou ficar quieto. Vamos fazer um banho de sangue um do outro. TĂĄ bem. Ficamos quites assim, nĂ©?
Um a um, as pessoas se afastaram do cantor e sua banda de um homem sĂł.
Uma pessoa disse isso.
â NĂŁo aguento mais isso. VocĂȘ Ă© exaustivo de estar por perto.
âNo fim, vocĂȘ Ă© sĂł egoĂstaâ, alguns diziam, insultando o cantor.
â Ă, sou egoĂsta. E daĂ?
â NĂŁo seja desafiador. Ă por isso que vocĂȘ sempre serĂĄ uma criança, incapaz de mudar. VocĂȘ nunca cresce como pessoa. Por que nĂŁo tenta pensar nos outros? Cresça de uma vez. VocĂȘ nĂŁo consegue, nĂ©? VocĂȘ Ă© sĂł uma criança burra, afinal. Aposto que acha que Ă© legal agir assim. Bem, estĂĄ errado.
Essa pessoa gritou até ficar com o rosto vermelho, então foi embora para algum lugar e nunca voltou.
Havia alguĂ©m que declarou, â VocĂȘ tĂĄ acabado â e entĂŁo virou as costas para o cantor tambĂ©m. â Pra ser honesto, todo mundo acha isso. VocĂȘ Ă© o Ășnico que nĂŁo entende.
O cantor estava perplexo. Ele estava fazendo suas mĂșsicas com sinceridade, cantando com todo o coração, como sempre fez. O cantor nĂŁo tinha mudado nadinha. Apesar disso, seus colegas de banda começaram a dizer, âA gente pode conseguir, vai ser um sucessoâ, com sonhos manchados por ganĂąncia.
As pessoas cantavam seus elogios, todas começaram a se sentir bem com isso sozinhas. Eventualmente, começaram a reclamar e despejar insultos sobre ele, dizendo que estavam erradas sobre ele, ou que não era para ser assim. Só aguentavam até certo ponto, diziam, e então eventualmente deixavam o lado do cantor.
O cantor tinha amado vĂĄrias mulheres, mas elas eram iguais.
No começo, toda mulher dizia coisas como, âIsso Ă© o destinoâ, ou, âNunca vou terminar com vocĂȘ, nĂŁo importa o quĂȘâ, ou âQuero estar junto atĂ© o dia que morrerâ, ou, âPor favor, sĂł nĂŁo me abandoneâ. Mas entĂŁo, eventualmente, começavam a reclamar, dizendo, âVocĂȘ nĂŁo sabe o que Ă© bondadeâ, ou, âVocĂȘ saiu dos trilhosâ, ou, âVocĂȘ Ă© um fracassoâ, ou, âVocĂȘ Ă© defeituosoâ, ou, âVocĂȘ Ă© um monstro psicĂłticoâ. No final, elas diziam, âMe devolve o tempo que passei com vocĂȘâ, e, âVocĂȘ nĂŁo vale nadaâ, e, âVocĂȘ nĂŁo Ă© diferente de um cafetĂŁoâ, e todo tipo de outras coisas horrĂveis. Quando ele as expulsava com raiva, elas continuavam falando sobre como ele as machucou, ou que ele deu um nariz sangrando, ou que torceu seus ossos. Algumas atĂ© exigiam dinheiro de compensação.
Havia apenas uma.
Ela era diferente de todas elas.
No dia em que a conheceu, âNĂŁo gosto das suas mĂșsicasâ, ela disse ao cantor.
â As suas cançÔes sĂŁo marcadas pela força, mas carecem de delicadeza. Ă como se vocĂȘ estivesse intoxicado consigo mesmo. SĂŁo improvisadas, de momento. SĂł sĂŁo boas no instante, sem um pingo de universalidade. VocĂȘ diz que suas mĂșsicas sĂŁo arte, mas nĂŁo acho que poderia ser mais convencido. O que vocĂȘ faz Ă© como se masturbar na frente das pessoas, e depois dizer, âOlha para mim, me masturbando descaradamente em pĂșblico assim, nĂŁo sou incrĂvel?â
O cantor, claro, ficou furioso. No entanto, era verdade que o cantor tinha focado na natureza de um momento especĂfico, e em vez de refinar o que dizia com cuidado, ele expressava as coisas como realmente eram. Ele tambĂ©m estava basicamente se gabando, dizendo, âSe quero me masturbar, faço isso na frente das pessoas. Sou tĂŁo honesto. Ă assim que o verdadeiro age. Sou incrĂvel, nĂ©?â Ela estava certa. Seria errado ficar bravo.
â VocĂȘ pode estar certa. Mas isso me irrita â disse o cantor a ela.
â Essa Ă© uma atitude muito culta, e eu acho mais legal que suas mĂșsicas.
â NĂŁo sei do que vocĂȘ tĂĄ falando, mas quero transar com vocĂȘ agora. Se importa?
â Gosto do jeito que vocĂȘ pensa. Quero fazer sexo selvagem, vĂĄrias e vĂĄrias vezes, e depois vou te observar de perto. Esse Ă© meu estilo, na verdade.
â TĂĄ, vamos fazer isso.
Assim, a cortina se abriu para o relacionamento deles. Eles discutiam com frequĂȘncia, mas o cantor nunca levantou a mĂŁo contra ela. Isso porque ela tinha dito a ele, âNo momento em que vocĂȘ ficar violento, vou te odiar, e vou terminar tudo, sem discussĂŁo.â Ela tinha dito isso claramente antes, entĂŁo o cantor sabia sem dĂșvida que ela faria isso.
Ela era uma pessoa muito honesta. Quando estava com ela, isso fez o cantor perceber algo. Ele não era honesto, ele estava se esforçando para tentar ser assim.
Para demonstrar sua prĂłpria sinceridade, o cantor precisava menosprezar outras pessoas.
VocĂȘs sĂŁo mentirosos, vivendo vidas cheias de engano, mas eu sou diferente, completamente diferente. Sou honesto, e puro, e bonito.
Ela nĂŁo era assim. Ela era simplesmente honesta, simplesmente ela mesma.
O cantor carregava uma placa com âhonestidadeâ escrito, vestia roupas nas cores da sinceridade, e constantemente dizia, âSou uma pessoa honestaâ, tentando ser reconhecido como a pessoa mais honesta do mundo.
NĂŁo importava o que as pessoas pensassem dela, ela parecia nĂŁo ser afetada por isso. Ela parecia imperceptĂvel, impossĂvel de compreender, mas ao mesmo tempo ele sentia que ela nĂŁo contava uma Ășnica mentira.
O cantor acreditava que a honestidade era justa. Ele achava que se deveria ser honesto porque era o certo a fazer, e era por isso que ele tinha que ser honesto.
Ela nĂŁo se importava nadinha com justiça. Ela era simplesmente honesta. Mesmo que usasse roupas enquanto andava por aĂ, no caso dela, era como se estivesse nua. O cantor a achava bonita, e quando ele disse isso a ela, ela olhou para ele sem expressĂŁo.
Ocasionalmente, ela cantava. Como ela era tĂŁo boa, ele perguntou se alguĂ©m a tinha ensinado. Acontece que a mĂŁe dela tinha sido cantora quando mais jovem, e ela cresceu ouvindo suas cançÔes de ninar. Ela nĂŁo escrevia mĂșsicas. Quando cantava, eram as mĂșsicas de sua mĂŁe, ou mĂșsicas que eram populares. No entanto, quando ela cantava, todas ressoavam como se fossem sua prĂłpria mĂșsica.
O cantor ficou deprimido.
â Quando ouço vocĂȘ cantar, sinto como se meu coração estivesse sendo despedaçado. Talento Ă© uma coisa cruel. Devo ter sentido que faltava algo nas minhas mĂșsicas, e eu precisava fazer algo a respeito. EntĂŁo escrevi letras que ninguĂ©m mais poderia. Queria ser especial. Era tudo por isso. Se eu tivesse o talento, deveria ter conseguido fazer qualquer mĂșsica minha sĂł de cantĂĄ-la. Mas eu nĂŁo consigo fazer isso.
Quando ele disse isso, ela fez uma expressĂŁo misteriosa e disse a ele: â Se vocĂȘ vai ficar tĂŁo decepcionado, por que nĂŁo desiste de cantar de uma vez?
No entanto, se ele desistisse de cantar, o cantor ficaria sem emprego, a renda mĂnima que tinha seria reduzida a nada, e quando alguĂ©m perguntasse, âQuem Ă© vocĂȘ?â, ele nĂŁo poderia mais dizer, âAqui, isso Ă© o que eu façoâ. Se perdesse seu lugar como cantor, o que aconteceria com o cantor?
Ele tinha medo de não ser mais cantor. O cantor abriu o coração honestamente e revelou esses sentimentos a ela.
â Se vocĂȘ perder isso, pode ser difĂcil por um tempo, mas vocĂȘ pode se surpreender ao descobrir que tĂĄ tudo bem â disse ela, como se nĂŁo fosse grande coisa.
â TambĂ©m tenho medo de te perder.
â Por que vocĂȘ me perderia?
â Quer dizer, nĂŁo consigo imaginar vocĂȘ querendo ficar comigo se eu nĂŁo fosse mais cantor.
â NĂŁo ligo se vocĂȘ Ă© cantor ou nĂŁo. Nunca gostei das suas mĂșsicas para começo de conversa. NĂŁo te disse isso logo no começo?
O cantor riu de como isso era bobo. Logo em seguida, ele estava chorando. Ele decidiu parar de cantar. EntĂŁo disse a ela: â Por que nĂŁo fazemos uma viagem? Vamos pra algum lugar bem longe.
â Okay â ela respondeu imediatamente, mas entĂŁo, de forma incomum, acrescentou uma condição. â Se nunca mais voltarmos, vamos partir numa viagem. Agora mesmo.
Quando as malas estavam prontas, eles saĂram de mĂŁos dadas. NĂŁo tinham um destino em mente. Iriam aonde os pĂ©s os levassem, na direção que sentissem vontade, e quando nĂŁo quisessem ir mais longe, ficariam lĂĄ. NinguĂ©m poderia mandar neles. Mesmo que alguĂ©m tentasse dizer o que fazer, eles nĂŁo ouviriam.
Eles decidiram que olhariam apenas para o que quisessem, com os olhos bem abertos, e se houvesse coisas que nĂŁo quisessem ver, passariam direto.
Fosse num campo de grama molhada pelo orvalho da manhĂŁ, ou numa noite em que o reflexo da lua brilhava num lago, ela cantava quando sentia vontade. O viajante que nĂŁo era mais cantor ouvia suas mĂșsicas com adoração.
No dia em que muitas estrelas caĂram, ela disse: â Essa viagem vai acabar algum dia, nĂŁo Ă©?
â Mesmo que a jornada termine, ainda estarei ao seu lado.
â Mas eventualmente nĂłs dois vamos morrer.
â Ainda nĂŁo.
â Mas Ă© uma questĂŁo de tempo. VocĂȘ quer ir antes de mim, ou depois?
â Nunca quero que vocĂȘ morra.
â Bem, entĂŁo morre primeiro. Vou me despedir de vocĂȘ e depois morro sozinha.
â TambĂ©m nĂŁo quero isso.
â Eu tambĂ©m nĂŁo, sabe.
âAinda temos que morrerâ, disse ela com resignação.
O viajante a amava mais do que tudo, mas agora ela se tornara extraordinariamente preciosa e insubstituĂvel para ele. E assim, ele percebeu que o que ela estava vendo e o que ele mesmo estava vendo era semelhante, mas diferente. Isso porque, para o viajante, ele estava tĂŁo eufĂłrico que a jornada parecia nĂŁo ter fim Ă vista. No entanto, ela nunca tinha desviado os olhos da verdade de que toda jornada deve chegar ao fim. Como grĂŁos de areia escoando numa ampulheta, o tempo que tinham juntos estava se esgotando. NĂŁo havia como desacelerar essa velocidade. AlĂ©m disso, nĂŁo tinham como saber quando a areia deles acabaria.
Sob um cĂ©u de estrelas cadentes, o viajante a abraçou forte e orou a Deus. âPor favor, deixe-me estar com ela pra sempre. Mesmo que estejamos destinados a ser separados pela morte, nĂŁo a tire de mim, nĂŁo importa o quĂȘ.â
Ahh, eu… pensou o viajante. Ele nĂŁo queria dizer âestou felizâ. Se pensasse que estava mais feliz que qualquer coisa, que qualquer pessoa, naquele exato momento, ele nĂŁo teria escolha senĂŁo parar o tempo, acabar com sua vida. Ele a mataria, depois se mataria. NĂŁo queria fazer isso, mas nĂŁo teria escolha.
â Ei, quero ver o mar â disse ela.
â Parece bom. Vamos pro mar.
Mesmo que a jornada terminasse, ambos ainda estavam vivos. Se ela quisesse, o viajante a levaria a qualquer lugar.
No caminho para o mar, sem ser solicitada, ela começou a falar sobre seu passado.
â Eu tinha uma irmĂŁ mais velha. Seis anos mais velha que eu. Ela era muito bonita. Quando eu tinha nove anos, ela ficou doente e morreu. Isso mudou tudo. Mesmo que a vida que foi interrompida tenha sido a da minha irmĂŁ, nĂŁo a minha. Quando minha irmĂŁ morreu, minha vida mudou.
â VocĂȘ jĂĄ pensou coisas como, âqueria poder ter mostrado esse mar pra minha irmĂŁâ?
â Nem um pouco. A doença que fez minha irmĂŁ definhar era cruel. Ela sofreu muito. Por isso, quando ela nĂŁo aguentava mais, um dia, ela me disse, âVocĂȘ tĂĄ numa boa, nĂ©? VocĂȘ nĂŁo estĂĄ sentindo nenhuma dor de verdade e pode continuar vivendo por um tempo muito longo. VocĂȘ vai poder fazer tanta coisa. Eu te invejo mais do que vocĂȘ poderia imaginar.â Minha irmĂŁ estava chorando. Ă patĂ©tico, mas naquele momento eu odiei minha irmĂŁ. Quer dizer, nĂŁo era minha culpa ela ter ficado doente. Eu queria dizer, âNĂŁo desconta em mimâ, mas me segurei. Ela ia morrer logo, entĂŁo senti pena dela.
â Aposto que sua irmĂŁ pediu desculpas.
â Sim. âNĂŁo se preocupaâ, eu disse a ela. âNĂŁo vou morrer ainda, entĂŁo vou ficar bem. VocĂȘ pode dizer coisas ainda mais horrĂveis.â Mas depois disso, minha irmĂŁ nunca mais reclamou, e entĂŁo ela morreu.
Os dois passaram vårios dias à beira-mar. Pensando nisso depois, eles não deveriam ter ficado lå. Deveriam ter partido imediatamente. No entanto, ficar alguns dias em um lugar, mais tempo se quisessem, não era particularmente incomum para eles. Como sempre, eles descansaram suas asas ali até decidirem para onde ir em seguida.
Era uma manhã enevoada. Em uma neblina tão densa que não conseguiam enxergar os próprios pés, os dois encontraram aquilo pela primeira vez.
Antes de pensar que poderia ser perigoso, a curiosidade venceu. Os dois foram para a beira-mar. A neblina era tĂŁo espessa que perderiam de vista as pontas dos dedos se estendessem a mĂŁo Ă frente. Confiando quase inteiramente no som, eles caminharam o mais perto possĂvel da linha da costa, de mĂŁos dadas, claro.
Apesar de estarem de mãos dadas, ele começou a sentir que poderiam se separar, e o viajante ficou inquieto. Quanto mais tempo passavam juntos, menos ele desejava se afastar. No entanto, como ainda não haviam se separado, não havia nada que pudesse fazer. Ele sentia a frustração o dominando, mas, ao mesmo tempo, essa insatisfação lhe proporcionava uma sensação de satisfação.
Ela nĂŁo dizia uma palavra. O viajante caminhava em silĂȘncio tambĂ©m.
Mas o que era essa neblina? Não seria estranho o sol jå ter aparecido a essa altura, mas ele não via sinal disso. As ondas molhavam os sapatos deles de vez em quando até pouco tempo atrås, mas agora era estranho. Ele caminhava e caminhava na direção do mar, mas o som das ondas ficava mais distante.
Como antes, ela nĂŁo dizia nada. De repente, o viajante se viu querendo ouvi-la cantar. Ele estava prestes a pedir uma mĂșsica quando, de repente, ela disse: â Ei, onde a gente tĂĄ?
Tradução: ParupiroHPara estas e outras obras, visite o Cantinho do ParupiroH â Clicando Aqui
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