Seija Musou | The Great Cleric
– Arco 05: Para Reviver a Guilda dos Curandeiros – Capítulo 04
[O Orgulho do Mestre]



Diferente de ontem, nossa ida às compras terminou sem incidentes. Quando voltamos para a guilda, os curandeiros estavam cutucando e examinando os utensílios mágicos da cozinha como crianças curiosas. Era até fofo.

— Voltamos, pessoal. Vocês vão fazer o jantar hoje?

Jord se aproximou com um sorriso.

— Já terminamos o treino de magia e estávamos procurando algo pra fazer de qualquer jeito. Não deve ser fácil cozinhar pra todo mundo sozinho. Ah, e esses itens mágicos são insanos, mas não tanto quanto essa sua lista de receitas. Tem até comida da minha cidade natal!

O resto do grupo ficou animado ao ver pratos de suas terras na lista.

— Vou deixar com vocês, então. Amanhã, eu e os curandeiros vamos à Guilda dos Aventureiros para demonstrar nossa magia.

Os rostos deles escureceram. Qual era o problema? A Substância X era ruim, sim, mas extremamente útil depois que se acostumava com ela. Todos tinham ficado aliviados quando perceberam que eu tinha esquecido de reabastecer o estoque, como se minha simples presença significasse barris daquela coisa.

— Vai ser um evento especial e gratuito. Já conversei com o papa sobre isso — continuei. — Vamos sair depois do almoço. Alguns cavaleiros vão nos acompanhar como guardas, mas o resto ficará aqui, tomando conta dos escravos. Enfim, boa sorte com o jantar. Vou descer.

Jord sorriu e bateu o punho no peito em saudação, seguido pelos outros. Retribuí o gesto, grato por ter um segundo no comando tão bom em manter o ânimo do grupo.

Ketty ficou no andar de cima para conversar com Nalia, e Lionel me acompanhou até o porão, o que significava que ele foi o único a testemunhar minha reação.

— Nós... estamos no subsolo, certo?

Nem mesmo o guerreiro de expressão impassível conseguiu esconder o choque.

— Acredito que, em algum momento, sim.

Palavra-chave: "acredito". O que estava diante de nós não era mais um porão subterrâneo, mas um espaço aberto. O sol brilhava onde, até aquela manhã, havia um teto iluminado magicamente. O vento soprava pelo que antes eram paredes. O modesto cercado de cavalos tinha se transformado em um pasto, com cercas, campos recém-arados e espaço de sobra para Forêt Noire correr à vontade. No momento, ela e os outros cavalos estavam deitados confortavelmente.

— Isso não pode ser real. Os anões são impressionantes, mas não tem como alguém ter feito isso. Parece... natural demais!

— Subi de nível, chefe — disse Pola do nada. — Meu trabalho. E minha habilidade de artificie também.

— Ah, você está acordada. Quer dizer... espera, foi você que fez tudo isso?

— Não está bom o suficiente. — Ela balançou a cabeça. — Ainda não consigo expandir o espaço.

Essa garota era maluca.

— Ah, você voltou! — Dhoran apareceu, e eu me preparei para a enxurrada de bajulação que viria. — Acabei de reforçar todos os pisos. Acho que agora vou poder experi— digo, criar umas coisas pro bem da guilda.

O maldito anão quase disse "experimentar". Antes que eu pudesse dar uma bronca nele, Pola ergueu as mãos para mim.

— Hã... sim? — perguntei.

— Pedras, por favor.

Fiquei olhando para ela, sem entender. Ela devolveu o olhar. Ficamos assim por um tempo. Então olhei para Dhoran, que imediatamente desviou o olhar.

— Acabaram. Eu disse isso quando entreguei as últimas pra ele de manhã.

Pola fez uma careta, os olhos se enchendo de lágrimas.

— Você mentiu, vovô.

Dhoran gritou de agonia, como se o desprezo da neta tivesse perfurado seu coração.

— Escuta, menina, você tem que entender! O chefe queria a guilda segura, entende? Precisei de muitas gemas pra fazer essa barreira, você sabe disso.

— Mas você disse que ele tinha um monte.

— E-eu disse...

Olhei para Lionel.

— Será que esses dois são bons em comparação a outros profissionais?

— São provavelmente alguns dos melhores na área. Entre os muitos rostos que já vi e nomes que já ouvi, posso contar nos dedos de uma mão os mestres no nível de Dhoran. No caso de Pola, talvez precisasse de duas.

Se Dhoran e Pola eram incríveis, e Lionel e Ketty também, então isso significava que...

— Não me diga que a Nalia também é talentosa como vocês. O que é? Combate? Artesanato?

— Nalia não tem muito interesse em luta ou magia.

Graças a Deus. Pelo menos uma normal.

— Mas ela é extremamente perceptiva, hábil em ocultar sua presença e magia, e tem grande conhecimento em etiqueta da realeza.

Retiro o que disse. Nenhuma dessas pessoas era normal. Comecei a achar que a insanidade era padrão nesse mundo.

— Luciel, rapaz, eu te imploro! — Dhoran caiu de joelhos. — Ordene que eu vá buscar mais pedras mágicas ou vá atrás delas você mesmo! Por favor!

Pola cruzou os braços, as bochechas infladas. Mas agora que as reformas estavam quase prontas, eu estava ficando sem tarefas para eles.

— Desculpe, mas não. Aqui, quero que escrevam suas ideias nesse caderno e tragam as propostas para mim. As pedras mágicas vêm depois.

— I-isso é cruel...

Dhoran pegou a pena e o papel com os ombros caídos. Pola, antes estoica, estava boquiaberta. A menina reservada da cela tinha desaparecido.

Fazia isso pelo meu próprio bem. Meu coração não aguentava mais "experimentos".

— Sejam detalhistas. Quero saber tudo o que o item faz, seus efeitos, essas coisas. Se eu achar útil, arrumo as pedras necessárias.

Eles se animaram um pouco e voltaram para seus ateliês no terceiro andar.

— Nunca é entediante com esses caras por perto — murmurei.

— Independente do equipamento que tivermos, protegerei você — garantiu Lionel. — É só dizer a palavra.

— Verdade.

Lancei Purificação em Forêt, torcendo para que a demonstração de magia na Guilda dos Aventureiros no dia seguinte fosse um sucesso.

O jantar daquela noite estava delicioso. Com a orientação de Nalia, os sabores tinham um toque que eu nunca imaginei. Parecia que eu tinha encontrado uma rival— ou melhor, não. Não fazia sentido ser orgulhoso quando havia tanto a aprender com ela.

Lionel e Ketty dividiram os escravos criminosos para o turno da noite, e depois de contatar Sua Santidade, finalmente fui dormir.

Na manhã seguinte, me espreguicei, treinei um pouco de magia e passei na cozinha para separar os ingredientes do café da manhã.

— Bom dia, senhor — cumprimentou Nalia.

— Bom dia. A cozinha é sua a partir de agora. Vou descer para treinar um pouco.

Ela fez uma leve reverência.

— Como desejar, senhor.

Quando cheguei ao quarto andar do porão, percebi que alguém já estava lá.

— Bom dia, Lionel.

— Estava esperando.

Ele sorriu. Um enorme espadão estava preso às suas costas, e um escudo gigantesco repousava em seu braço esquerdo.

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— Como você sabia que eu viria aqui embaixo?

— Somos criaturas de hábito.

— Justo. Então, o que está fazendo aqui?

— Acho que prometi treiná-lo e queria cumprir essa promessa.

— Certo, agora qual é o verdadeiro motivo? Eu consigo correr sozinho sem problemas.

Ele deu de ombros.

— Quero ver o quanto minhas habilidades ficaram enferrujadas. E tem mais uma coisa. No passado, um amigo meu falou sobre um aprendiz que encontrou, alguém que nunca recuava diante de um ferimento, e eu fiquei com inveja na época.

Não podia ser o meu mestre, certo? Lionel sorriu, como se tivesse lido meus pensamentos.

— O nome dele era Brod, também conhecido como o Furacão. Duas décadas atrás, nosso duelo terminou em empate, e desde então trocamos cartas.

Sabia! O ditado "os iguais se atraem" me veio à mente. Infelizmente, agora eu tinha certeza absoluta de que Lionel era tão obcecado por batalhas quanto seu amigo.

— Só um lembrete: eu sou um curandeiro. Por favor, não me mate por acidente.

— Verdade, você tem um compromisso importante hoje. Vou me lembrar disso.

— Isso já é alguma coisa, eu acho — gemi. — Vou fazer um pouco de corrida para aquecer primeiro.

Dei algumas voltas e fiz alongamentos sob seu olhar atento. Estava começando a sentir aquele meu famoso pressentimento ruim sobre essa luta, mas não havia como fugir, então engoli em seco, ergui uma barreira e segui em frente.

Logo percebi uma coisa. Embora não pudesse dizer quem era mais forte, aprendi que Lionel e Brod tinham forças em áreas diferentes. Enquanto meu mestre se destacava em velocidade, precisão e movimento, Lionel era como um golem resistente. Ele era uma muralha, e não havia como passar pelo seu escudo ou pelos golpes devastadores de sua lâmina titânica. Simplificando, Brod era a pantera, enquanto Lionel era o urso.

Outra diferença marcante era o estilo de ensino deles. Meu mestre era muito meticuloso em seu treinamento, enquanto Lionel era mais direto e prático. Ainda assim, o jeito que ele entrou em pânico quando acidentalmente arrancou meu braço esquerdo me lembrou de Brod nos tempos em que eu ainda o chamava de "instrutor".

Espera aí… sem Cura Extra, eu teria morrido agora mesmo! De que serviam aqueles selos de escravo se ele podia me mutilar tão facilmente?

Durante toda a luta, rezei e implorei aos céus para que alguém viesse nos chamar para o café da manhã e garantisse que isso não se tornasse um hábito. No final do treinamento, já tínhamos reunido uma plateia de escravos curiosos.

— Ah, bom trabalho ontem à noite, pessoal. Descansem depois do café da manhã — disse a eles.

Eles me olharam boquiabertos, mas eu estava faminto demais para me importar. Entrei no elevador mágico e subi. Ontem, nos certificamos de que ele realmente funcionava.

Os outros já estavam me esperando na cozinha, a comida intocada.

— Vocês não precisavam esperar.

Sentei-me, dei graças pela refeição e comecei a comer, quando alguém do grupo perguntou:

— Você vai fazer curas quando formos à Guilda dos Aventureiros hoje?

— Se for necessário. Vou intervir em casos de petrificação, venenos ou coisas que o Cura Avançada não possa resolver, mas quero que vocês sejam a base de Yenice.

— Podemos assistir você trabalhar, se tivermos oportunidade?

— Claro. Já expliquei o essencial do meu método, mas ver com os próprios olhos sempre ajuda.

Conversamos enquanto comíamos, e mais uma vez fiquei impressionado com Nalia. Ela era extremamente habilidosa com esse tipo de trabalho doméstico, mas devia ser difícil lidar com tudo sozinha. Talvez um escravo assistente para ajudá-la não fosse uma má ideia.

Guardei esse pensamento e peguei um mapa da Guilda dos Aventureiros, mostrando onde queria que cada um ficasse posicionado. Ninguém se opôs ao plano enquanto discutíamos os detalhes. Eu me vi grato ao papa e a Granhart por me colocarem nessa posição.

— Vamos mostrar do que somos capazes!

— Sim, senhor!

Depois disso, me tranquei na sala do mestre da guilda até ouvir uma batida na porta naquela tarde.

— Entre.

Dhoran e Pola entraram, trazendo rolos de pergaminho amarrados com fitas.

— Hum… vocês conseguiram dormir um pouco, né?

Eles pareciam exaustos, com olheiras e os olhos vermelhos. Colocaram os pergaminhos sobre minha mesa sem dizer uma palavra.

— Tudo isso...

— Metade é nossa. Metade é pra vender.

— Vai vender por um bom preço — acrescentou Pola. — Queremos usar metade do dinheiro para comprar mais pedras mágicas.

Era um monte de coisa para ler de uma vez. Então tive uma ideia. Só precisava usar um pouco de "mágica de escritório".

— Vou dar uma olhada e responder depois. Agora, vão tomar café e descansar um pouco, certo?

Mas não havia mágica aqui.

— Não sairemos até que você leia — disse Pola, pequenas lágrimas nos cantos dos olhos cansados.

— Olha pra ela, Luciel. Você não pode fazer a garota chorar — insistiu Dhoran.

— Pelo amor de Deus. E você é péssimo ator, aliás. Mas tudo bem. Quem quer ser o primeiro?

— Ora, quem mais...

— Eu! — gritou Pola, encarando seu avô.

— Certo, entendi. Vai descansar no sofá enquanto isso.

Por algum milagre, consegui revisar tudo a tempo de Nalia vir me chamar para o almoço.

— Pola, dois aprovados, cinco adiados. Dhoran, cinco aprovados, um adiado.

— E as pedras mágicas?

— As pedras mágicas!

As propostas que rejeitei eram tão absurdas que simplesmente não dava para aprová-las com a consciência limpa, só pelo que vi de relance nos relatórios.

— Vamos às compras em breve para pegar os materiais necessários. E sim, prometo comprar as pedras mágicas.

Pola e Dhoran deram um high-five e finalmente relaxaram. Se juntaram a mim para o almoço, mas estavam visivelmente exaustos. Eles realmente incorporavam a ideia de colocar a vida no próprio trabalho.

Pouco depois, era hora de ir à Guilda dos Aventureiros.

— Certo, pessoal, vamos nessa!

— Sim!

— Boa viagem.

— Façam um bom trabalho!

Palavras de incentivo nos acompanharam enquanto partíamos para o Sindicato dos Aventureiros. Ninguém disse nada durante os dez minutos que levamos para chegar ao destino. Então, parei na porta e me virei para o grupo.

— Vamos mostrar a Yenice do que somos capazes.

— Sim, senhor! — responderam com entusiasmo.

Eu esperava que este lugar se tornasse como uma segunda casa para eles.

— E não se esqueçam de garantir que as pessoas saibam o quão fortes são nossos guardas. Fiquem alertas, cavaleiros.

— Sim, senhor!

— Lionel, Ketty, comigo.

— Como desejar.

— Mmhmm!

Abri a porta e parei no lugar.

— Hm, então é isso que estamos enfrentando.

Ainda nem tínhamos descido as escadas e o salão já estava lotado de pacientes, alguns se contorcendo pelos efeitos do veneno, outros imobilizados pela petrificação.

— Vamos seguir o plano C! — gritei para minha equipe. — Paramos na recepção e depois descemos. Sem desvios. Vamos direto ao porão, entenderam? Eu cuidarei dos casos mais graves.

Seguimos em frente. Eu havia planejado três cenários para hoje. O plano A era para o caso de encontrarmos resistência, o plano B se não houvesse pacientes e o plano C assumia que o Sindicato dos Doutores era ainda menos qualificado para curar do que eu imaginava.

— Meu nome é Luciel, curandeiro de rank S — disse à recepcionista. — Estou com o Sindicato dos Curandeiros de Yenice, a pedido do vice-mestre Jeiyas. Por favor, avise que chegamos.

— S-Sim, senhor.

Ela saiu apressada e eu me virei para a multidão.

— Vamos tratar todos vocês, cortesia do Sindicato dos Curandeiros! Por favor, mantenham a calma e a ordem, e prometo que todos serão atendidos. Estabeleceremos uma área de triagem para que os pacientes mais urgentes tenham prioridade. Quem reclamar disso pode e será recusado. Da mesma forma, quem se tornar violento não receberá tratamento. Não somos anjos, nem uma instituição de caridade. Mas queremos curar, e essa é a mais pura verdade. Deixem-nos ajudá-los.

— Por favor! — completaram os outros curandeiros em uníssono.

Tê-los ao meu lado me deu confiança. Vi Jeiyas subindo as escadas e disse a ele:

— Vou me concentrar nos que estão em estado mais crítico aqui no primeiro andar. Farei o que puder, mas, como disse, não sou um deus.

— Entendido, senhor. Por aqui, homens.

Ele guiou os outros curandeiros para o andar de baixo, deixando-me com Lionel e Ketty ao meu lado. Comecei a curar.

Notei um jovem aventureiro encurvado perto das escadas, metade do corpo transformada em pedra, incapaz até de falar. Olhei para seu companheiro.

— Ele foi envenenado? Há alguma paralisia? Se não tiver certeza, apenas me diga o que sabe.

O homem segurou o que restava do amigo e disse, com a voz embargada pelas lágrimas:

— F-Foi um gás no labirinto. Por favor, faça alguma coisa!

Ele tentou se agarrar a mim, mas Lionel se colocou no meio. Enquanto eu começava a entoar Dispel, o homem voltou-se para o amigo com desespero. O corpo do aventureiro ferido brilhou, sua forma ossificada retornando à carne e ao sangue. Após um Cura Intermediária, ele parecia estar bem, mas ainda pálido, então lancei um Recuperar para normalizá-lo.

— Ele deve estar estável agora. Se perdeu sangue, deixe-o descansar por alguns dias.

Olhei para o homem que Lionel tinha impedido de se aproximar, suspirei e lancei Recuperar nele também.

— Eu entendo querer cuidar de quem você ama, mas cuide de si mesmo primeiro. Você estava quase tão mal quanto ele.

Atravessei a multidão de pacientes, restaurando consciências e trazendo outros de volta do limite, arrancando gritos de comemoração a cada "milagre". Honestamente, tudo estava indo perfeitamente.

Até que não estava mais.

— Formem uma fila! Vou atender todos! — gritei, mas então um tumulto no andar de baixo chamou minha atenção.

— Já estou de saco cheio! Me curem logo, seus desgraçados! Quem vocês acham que eu sou?! — um homem-besta musculoso berrou, sendo contido por dois cavaleiros enquanto Jeiyas tentava, sem sucesso, acalmá-lo.

— Podemos parar com tudo agora, se preferir! — retruquei. — Eu não sei quem você é ou de onde veio, mas não tenho paciência para o seu tipo. Que direito você tem de reclamar de um trabalho voluntário que não te custa um cobre?

Desci as escadas para o campo de treinamento.

— Não me faça apresentar uma queixa oficial ao seu sindicato.

— E quem diabos é esse moleque?

— O "moleque" é um curandeiro de rank S. Luciel. Eu dirijo o Sindicato dos Curandeiros aqui, o que me dá autoridade para te dar duas opções: fique quieto e espere sua vez ou estrague tudo para todo mundo e ninguém mais será curado.

Lionel se posicionou à minha frente, Ketty atrás, e vários aventureiros ainda aguardavam ansiosos por tratamento.

O homem me lançou um sorriso arrogante.

— Certo, senhor rank S, vamos ver como você lida com isso! Agora!

Do nada, nuvens de pó negro voaram em minha direção. Lionel estalou a língua e ergueu seu escudo, seguido por Ketty com seu manto, mas era impossível para os dois bloquearem todos os grãos.

— Quero ver você curar sem poder usar magia! Estamos fora! — ele gargalhou.

— Você não vai escapar! — gritou Lionel. Parecendo frustrado por ter falhado em me proteger, ele ergueu sua grande espada, quase a lançou contra o homem em fuga, mas se conteve. — Maldição!

Nosso alvo começou a desaparecer rapidamente, deixando para trás apenas um tronco com um pedaço de papel preso.

Ninjutsu?! Esse cara é um ninja?!

— Uma ilusão. Magia negra! — Lionel gritou, correndo para a outra escadaria, por onde nosso inimigo e vários outros homens-besta fugiam. — Alguém pare aquele homem!

Mas muitos ainda estavam gravemente feridos, e Jord e os outros tinham sido afetados pelo pó. Nossos atacantes atravessaram o campo de treinamento e subiram as escadas. Estavam livres, e tínhamos muitas pessoas para tratar para desperdiçar tempo na perseguição.

— Inacreditável... — Jeiyas afundou os ombros dramaticamente. — Quero todos que puderem se mover procurando por esses bastardos!

— A expressão de Lionel era semelhante à do mestre da guilda. — Sinto muito, Luciel.

— Escapou bem debaixo das minhas patas — choramingou Ketty.

— Ei, isso significa que não vamos ser curados? — resmungou um aventureiro.

— É só isso que vocês curandeiros podem fazer? Qual é, eu tô morrendo aqui — queixou-se outro.

— Você sabe o quanto foi difícil eu me arrastar até aqui?

Sem ter para onde direcionar sua frustração, os aventureiros se voltaram contra os curandeiros, cuja magia de cura havia sido completamente anulada. Precisávamos fazer algo sobre essa falta de resistência.

Caminhei lentamente até o centro e entoei:

— Ó santa mão da cura. Ó sopro nascente da terra. Ouça minha prece. Expulse as impurezas diante de mim e conduza-as à salvação. Purificação!

Meu corpo brilhou e cada partícula de poeira desapareceu. Em seguida, voltei minha atenção para os curandeiros.

— Ó santa mão da cura. Ó sopro nascente da terra. Ouça minha prece. Expurgue tudo que apodrece e restaure o equilíbrio. Recuperação!

O feitiço os envolveu.

— Parece que algumas pessoas precisam de mais uns canecos.

Jord e os outros recuaram. Agora, a magia deles voltaria a funcionar normalmente, e os reclamões conseguiram se recompor.

— Isso resolve essa parte. Desculpem pelo transtorno, pessoal. Agora, aqueles que ainda precisam de cura, aguardem pacientemente — anunciei. — Ou vou amarrá-los na parede. Que tal isso, vice-mestre da guilda?

Jeiyas se recuperou do choque e assentiu.

— Quem tiver algo a dizer pode dizer na minha cara!

— Certo, vamos continuar de onde paramos.

Mais uma vez, me vi grato à Substância X. Apesar de seus efeitos colaterais (especialmente o quão difícil tornava o aumento de nível), seu aumento de resistência foi extremamente útil aqui. Seria bom para esses caras simplesmente se sentarem e beberem um pouco disso.

A cura continuou. Embora Jord e seu grupo não fossem habilidosos o suficiente para lançar Dissipar, Recuperação funcionava bem para a maioria das aflições. Eu intervinha nos casos mais graves ou em ferimentos e deformações severas. Enquanto o membro ainda estivesse tecnicamente preso ao corpo, um lançamento de Cura Avançada bastava para restaurá-lo, e essa demonstração de poder rendeu ainda mais devotos. Amigos e entes queridos se abraçavam, dançavam juntos e explodiam em alegria.

Mas uma coisa me intrigava. Por que ninguém estava indo embora? Curávamos e curávamos, mas ninguém realmente saía do salão da guilda. Essas pessoas não tinham mais nada para fazer? Meus companheiros já estavam exaustos devido ao grande número de pacientes, então decidi entrar em ação e fazer as rodadas por conta própria.

— Ó santa mão da cura. Ó sopro nascente da terra. Ouça minha prece. Expurgue tudo que apodrece e restaure o equilíbrio. Recuperação! Pronto, isso deve bastar.

Olhei ao redor.

— Alguém mais precisa de tratamento? Conseguimos atender a todos? Por favor, olhem em volta e nos avisem se virem alguém com dor.

Nenhuma resposta veio.

— Aventureiros — chamou Jeiyas —, nossa guilda falhou com a Guilda dos Curandeiros, apesar da boa vontade deles. Alguns de vocês criticaram esses homens generosos quando a culpa nunca foi deles. São aqueles homens que merecem sua raiva!

Os aventureiros se encolheram, envergonhados.

— Disseram que o serviço de hoje seria gratuito, mas isso é suficiente para nós? Não! Inferno, não! Nós, aventureiros, nós, bestiais, sempre pagamos nossas dívidas! Vamos encontrar esses desgraçados e quem os colocou nisso! Vamos, pessoal, temos uma reputação a manter!

O salão tremeu com os vigorosos gritos e aclamações, e, após um rápido olhar e uma leve reverência, eles subiram as escadas às pressas.

— Sinto muito por isso, Luciel. Vamos compensar você — disse o dragonewt, abaixando a cabeça.

— Por favor, Jeiyas, isso não é necessário. Eles estavam preparados para nós. O plano deles era claramente impedir nossa cura e depois espalhar que não conseguimos cumprir nossa promessa. Queriam manchar a reputação da guilda.

— Isso... é bem provável.

Bom, não fique todo evasivo comigo.

— Você acha que eles estão ligados a Shahza? Ou talvez à Guilda dos Doutores?

Minha equipe ficou surpresa. Eu nunca havia contado a eles sobre o envolvimento da guilda rival nos nossos problemas. Ou para ninguém, na verdade. Era uma informação delicada.

— Não posso afirmar nada com certeza — respondeu Jeiyas. — Mas sei que a Guilda dos Doutores vende aquele pó negro. Ele é mais comumente usado contra monstros para impedir que usem magia.

— Então praticamente qualquer um poderia conseguir isso. De qualquer forma, sua guilda conhece a cidade melhor do que nós. Vou deixar isso com vocês.

Eu tinha a sensação de que só pioraríamos as coisas se nos metêssemos, e não podia colocar os outros (ou, cof cof, a mim mesmo) em mais perigo.

— Não sei o quanto confia em nós depois disso, mas vamos chegar ao fundo disso. Eu juro.

A verdade era que eu realmente não confiava neles. Só estava dando o benefício da dúvida.

— Vamos voltar para a Guilda dos Curandeiros. Entre em contato assim que descobrir algo.

— Faremos isso.

Ele fez uma última reverência e nos acompanhou até a porta.

— Até a próxima — despedi-me.

Lionel nos conduziu para fora e deu um passo antes de parar abruptamente.

— O que foi...?

Um grupo carregando vários aventureiros feridos passou correndo por nós e entrou no salão, me cortando no meio da frase. Jeiyas olhou para eles e arregalou os olhos.

— Irmão! — gritou ele.

— Coloquem todos a três metros de mim, e eu usarei Cura Avançada em Área — ordenei. — Quero que o resto de vocês cuide de venenos e paralisias.

— Sim, senhor! — responderam os curandeiros.

O dragonewt incapacitado, presumivelmente o mestre da guilda, despertou de repente e lançou um olhar furioso para nós.

— Malditos curandeiros! — rosnou ele. — O que mais vocês querem tirar de nós?!

Ele estava em péssimo estado, a pele descolorida. Ainda lembrava Jeiyas, mas com traços mais rústicos que aumentavam a ferocidade em seus olhos. Ainda assim, aquilo não intimidava. Fiquei aliviado por ele estar consciente, mas, mais uma vez, confrontado com a dura realidade dos curandeiros, não pude evitar um certo desânimo.

— Desta vez, não estamos cobrando nada — disse eu, com uma calma surpreendente até para mim. — Agora deite-se e nos deixe ajudá-lo, droga!

Após minha mudança completa de calma para frustração, o dragonewt relaxou. Certifiquei-me de que todos estavam ao alcance e lancei um Área de Cura Elevada. A maioria dos ferimentos parecia interna, então rapidamente usei Purificação, Dissipar e Recuperação no pomposo mestre da guilda até que sua pele finalmente voltasse a um tom saudável. Ignorando o choque em seu rosto enquanto ele apalpava o próprio corpo, virei-me para os outros dez aventureiros que ainda precisavam de atenção.

Quando tudo se acalmou, Jeiyas me apresentou ao seu irmão mais velho, Goldhus.

— Me desculpe por gritar mais cedo. Sou Luciel, curandeiro de Rank-S e mestre da Guilda dos Curandeiros de Yenice. Conversei com Jeiyas ontem sobre fazer uma demonstração dos nossos serviços hoje, sem custo, e é por isso que estou aqui agora.

O mestre da guilda ficou boquiaberto, então olhou para o irmão, que acenou em resposta. Goldhus imediatamente caiu de joelhos e se prostrou.

— Eu peço desculpas do fundo do meu coração pelo meu comportamento anterior!

Rapidamente o fiz se levantar, temendo continuar uma conversa com a nuca dele. Mas provavelmente já era tarde demais para impedir a fábrica de rumores. Droga, eu já podia sentir uma dor de cabeça chegando.

— Mestres de guilda não deveriam se ajoelhar assim, muito menos bem na entrada. As pessoas vão começar a falar.

— Sim! Sim, você tem razão! Minhas mais profundas—

— Por favor, apenas fique de pé.

— Certo. Muito obrigado.

Felizmente, evitamos um loop infinito, mas esse não podia ser o mesmo cara que me encarava com tanta hostilidade momentos atrás.

— Sou o mestre da guilda daqui. Me chame de Goldhus. Sinto muito pelo que aconteceu antes. Ficar preso naquele labirinto afeta a mente, e eu não fazia ideia de que você era Rank-S.

Labirinto ou não, a reação dele antes estava longe de ser suave.

— Parece que você entende o que um curandeiro pode fazer, senhor. Mas sua impressão sobre nós não é muito boa, não é?

A expressão dele se fechou.

— Não exatamente. Quando era mais jovem, fui negado tratamento muitas vezes, fui extorquido. Mas há alguns anos, durante uma reunião na sede da Guilda dos Aventureiros, ouvi falar de um curandeiro diferente. Meio esquisito. Você, Luciel.

Brod era um ex-aventureiro, então provavelmente Goldhus também era. Não era incomum que eles fossem menos receptivos comigo. Mas o que me intrigava mais era quem andava espalhando boatos sobre mim.

— Isso é... interessante.

— Dizem que você morou na Guilda dos Aventureiros de Merratoni, onde treinava e curava qualquer um, independente de sexo, raça ou gravidade dos ferimentos, por uma prata cada e com uma paixão absurda.

Agora as coisas estavam saindo do controle.

— Eu adoraria ouvir mais.

— Bem, em menos de dois anos, você foi transferido para a Cidade Santa e, em menos dois, chegou ao Rank-S. Chamam você de curandeiro criado entre aventureiros.

Droga, tudo isso era verdade. Não tinha como negar.

— Mas ouvi dizer que os dragonewts eram contra a fundação de uma Guilda dos Curandeiros por aqui.

— Certo. Por mais elogios que eu ouvia sobre você, minha visão era limitada, já que eu lidero uma guilda cheia de feras. Na época, concordei com a decisão do conselho.

— E agora?

— Nunca imaginei que você faria tanto por nós sem esperar nada em troca.

Ele franziu a testa.

— Você até curou ferimentos que a Guilda dos Médicos já tinha desistido de tratar.

Havia apenas uma coisa que eu precisava corrigir.

— Só para deixar claro, os serviços gratuitos foram apenas por hoje.

Entreguei a ele uma cópia das nossas diretrizes.

— Esses são os preços normais que cobramos.

— Isso aqui?

— Sim. Usando o tratamento que fiz em você como exemplo: a Cura Elevada custa três ouro, a Purificação sai por cinquenta pratas, Dissipar por dois ouro e Recuperação por um ouro, totalizando seis ouro e cinquenta pratas. Acha que é caro?

As diretrizes também especificavam que os preços poderiam variar até cinquenta por cento para cima, mas eu preferia seguir os valores padrão.

— De jeito nenhum! Isso é uma pechincha! Poções de alto nível podem custar cinco ouro cada, e antídotos chegam a um ouro às vezes. E nem são tão eficazes quanto sua magia.

— Bom ouvir isso. Demorei muito tempo e sofri bastante para definir essas taxas, então fico feliz que pareçam justas.

Já tinha perdido a conta de quantas pesquisas de mercado fizemos. E não só com curandeiros e clínicas, mas também com aventureiros e cidadãos que seriam impactados pelos preços.

Outra proposta que fizemos foi empregar curandeiros iniciantes com pouca habilidade nas Guildas dos Curandeiros de Shurulean ou dos Aventureiros, onde poderiam treinar magia pela metade do preço em troca de moradia e alimentação. Os arcebispos adoraram a ideia e estavam bem animados para criar um ambiente melhor para formar curandeiros mais qualificados. Eles só não queriam que eu ficasse responsável pelos detalhes.

— Um jovem com menos de vinte anos não tem que fazer inimigos! — o arcebispo Muneller, com aquela cara de mercador de rua, me disse. — Nós já estamos no fim da vida, e as pessoas aceitarão nossas propostas com mais facilidade. Se não aceitarem, pelo menos teremos que suportar o desprezo por pouco tempo. Isso tem potencial para durar gerações, e queremos deixar nossa marca na história, como você.

Então cedi e deixei que cuidassem de tudo. Além disso, comecei a me sentir mal por sempre pensar que o rosto de Muneller parecia o de um camelô.

No fim das contas, os arcebispos mereciam muito mais crédito pela criação das diretrizes do que eu, mas Sua Santidade decidiu que eu seria o rosto público do movimento. Os anciãos foram devidamente creditados no documento, e isso foi o suficiente para eles. Graças a eles, fui para Yenice com uma paixão renovada pelo meu trabalho, então era gratificante ver suas contribuições sendo reconhecidas.

— Agora, me diga uma coisa... Luciel, você é um aventureiro, certo? — perguntou o mestre da guilda.

— Hã, sim?

Eu sentia muitas coisas sobre essa conversa, e “coisa boa” definitivamente não era uma delas.

— Então aceitaria uma missão?!

— Desculpe, não tenho nível alto o suficiente para isso.

Eu já esperava por isso, mas, felizmente, meu ranque de aventureiro era muito baixo para que ele pudesse me nomear para um trabalho particular.

Goldhus fez uma careta. — Então, seria possível montar uma clínica temporária na frente do labirinto? O Adventurer’s Guild cobriria os custos!

Ele estava realmente se agarrando a qualquer possibilidade agora. E, infelizmente, estava pedindo demais.

— Nem pensar. Não depois do problema que tivemos hoje, e ontem mesmo fomos atacados na rua. Não posso sair até que a guilda consiga operar com segurança e eficiência sozinha. Não enquanto eu estiver no comando, pelo menos.

— Eu... eu entendo.

Soltei um suspiro de alívio ao ver que ele finalmente desistira.

— Nesse caso, você está dizendo que pode ser possível depois que tudo estiver resolvido.

Er... retiro o que disse. Agora ele estava dobrando a aposta. — Escuta, eu sei que você me quer especificamente, mas eu sou um mestre da guilda. Não posso simplesmente deixar a guilda para outra pessoa.

— Que coincidência! Eu também sou um mestre de guilda. E minha guilda fará tudo ao seu alcance para garantir que a sua possa operar sem problemas. Você tem a minha palavra!

O cara não estava ouvindo nada do que eu dizia. Lancei um olhar para meu grupo em busca de uma salvação, mas todos desviaram o olhar. Até os cavaleiros. Os dois escravos, no entanto, pareciam genuinamente animados com a sugestão de Goldhus.

E assim, nossa demonstração terminou sem maiores incidentes... se é que qualquer coisa do que acabou de acontecer poderia ser considerada “sem incidentes.” Eu sentia que estava sendo puxado cada vez mais fundo em tramas sombrias além do meu controle.


Tradução: Carpeado
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